Folha de S. Paulo


O Brasil, os porcos, a educação...

O cu do mundo este nosso sítio", diz Caetano Veloso na sua genial "O Cu do Mundo", que está no mais do que antológico disco "Circuladô", de 1991. A canção tem 24 anos, mas lamentavelmente não perderia a sua atualidade se fosse escrita amanhã.

Anteontem, no "Programa do Jô", o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, falou da importância da educação e da cultura para desasnar as pessoas. Fiquei feliz com a sua falta de jogo político, ou seja, com a sua coragem de dizer o que deve ser dito, de não "fazer média", de não ser politicamente correto.

Bem, se o vão deixar trabalhar é outra história. Parece que, definitivamente, gente instruída não interessa aos governantes de turno. O ministro quer pôr em prática o que a Alemanha, a Itália, o Japão, entre outros, fizeram no pós-guerra, ou seja, investir pesada e seriamente na educação básica, o que, obviamente, significa começar pela (re)preparação dos professores e seguir pela reforma e/ou construção de escolas adequadas, pelo pagamento de salários decentes etc., etc., etc.

E há outra solução para este país senão começar tudo de novo, o que significa tentar reconstruir o sistema público de ensino, desmontado pela ditadura militar e lamentavelmente não reconstruído pelos incompetentíssimos governos civis? E por onde é que se começa essa reconstrução? Pelo começo, é óbvio! E o começo é a educação básica, em que talvez se consiga ensinar aos nossos futuros adultos um pouco do que é necessário para ser minimamente esclarecido, lúcido, educado, civilizado -sensível e racional, ao mesmo tempo.

Não foi só na educação que não fomos capazes de avançar e/ou de refazer o que a ditadura arruinou. Na segurança pública a situação é a mesma. Estão aí as intermináveis chacinas comandadas por policiais para provar que a cultura da violência policial, fortemente alimentada e tolerada pela ditadura, não foi devidamente enfrentada pelos governos civis, incompetentes até a medula.

Pois bem. Anteontem o Brasil assistiu a mais uma das frequentes demonstrações inequívocas de que somos uma grande vergonha. Um caminhão carregado de porcos gordos tombou alguns metros antes de chegar a uma cabine de pedágio. Por imperícia e/ou cansaço, o motorista fez uma manobra inadequada, e o caminhão tombou. Isso foi o começo de um circo de horrores. Não preciso relatar o que se seguiu, já que tudo foi divulgado à exaustão.

Essa enésima patética tragédia deixou clara, mais uma vez, a nossa insuperável incompetência para a resolução de problemas que exija (a resolução) noções básicas de matemática, de física, de bom senso e, no caso em tela, de vergonha na cara, de nobreza de sentimentos.

Só pela cabeça de incompetentes e/ou bestas humanas pode passar a ideia de que é daquele jeito que se resolve o problema. O resultado, mais uma vez, foi assombroso, seja pela coisa em si, seja pelo que sofreram os que de um modo ou de outro foram prejudicados pela pouco inteligente condução do processo.

Será que a concentração dos esforços na educação básica formará (sabe Deus quando) adultos capazes de entender, por exemplo, que um caminhão de 4,9 metros de altura não passa sob uma ponte de 4,8 metros?

Será que esses esforços formarão administradores públicos (aí nem Deus sabe quando) capazes de pôr em prática alguns dos milhares de maneiras de prevenir esse tipo de demonstração da nossa incurável burrice ou, tragédia consumada, de agir com um mínimo de inteligência? Por enquanto, o Brasil é burro, muito burro demais. É isso.

inculta@uol.com.br


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