Folha de S. Paulo


Outra vez, é hora de Diretas-Já!

A delação de Joesley Batista colocou um fardo adicional sobre o combalido governo Temer. As graves acusações de ser conivente com uma tentativa de obstrução da Justiça, de tentar vender uma decisão do Cade e de ceder informações privilegiadas do Banco Central para um agente do mercado abalaram ainda mais um governo com baixa aprovação popular e índices econômicos ruins. Discute-se agora, se, uma vez fora do cargo, ele deve ser substituído por eleições diretas ou indiretas. A resposta é fácil –na verdade, é inevitável.

O grande problema do governo Temer sempre foi a falta de legitimidade da sua agenda política. Ele aproveitou que não precisou ser eleito e que tinha ascendência sobre um Congresso unido pelo medo e introduziu uma agenda liberal agressiva, tentando empurrá-la "sem mandato" e "na marra", como cinicamente descreveu um dos autores da "Ponte para o Futuro".

A PEC do teto foi aprovada sem qualquer debate público que estivesse a altura do seu impacto –e, se dependesse do governo, o mesmo teria acontecido com a reforma da Previdência e com a reforma trabalhista.

Se não fosse a enorme rejeição da população, combinada com uma inédita articulação das centrais sindicais, as duas reformas já teriam sido também aprovadas, sem debate.

A falha democrática do governo Temer não foi ter colocado na agenda o equilíbrio fiscal ou a reforma da Previdência. A falha foi ter colocado esses temas para tramitar de maneira acelerada, sem um amplo debate e negociação com a sociedade civil. Temer aproveitou a janela de oportunidade que se lhe abriu: a coincidência de que não tinha sido eleito e portanto não devia nada aos eleitores e de que o Congresso esperava com a aprovação de reformas liberais conseguir um salvo conduto do mercado para reagir contra as investigações de corrupção.

A ausência de democracia na aprovação de reformas não é detalhe. Debates que tivessem acontecido no período eleitoral, seguidos de debates durante a tramitação parlamentar e uma negociação mais equilibrada com os diversos atores sociais seguramente modificariam os seus termos.

Uma sociedade civil informada jamais apoiaria uma reforma da Previdência que começasse por limitar o Benefício de Prestação Continuada que atende idosos pobres e desassistidos, deixando intocada a privilegiada previdência dos militares. Uma sociedade bem informada também não teria aceitado limitar o financiamento dos hospitais e das universidades, como fez a PEC do Teto, antes de trazer progressividade ao sistema tributário e fazer os ricos pagarem a sua parte nos impostos, como o resto dos brasileiros.

Temer está na berlinda não apenas porque as delações o implicam, mas porque tem uma aprovação pequena, boa parte da qual advém do seu déficit democrático. Não importa se ele vai renunciar, pressionado pelos escândalos, se a chapa dele com a ex-presidente Dilma vai ser cassada por abuso do poder econômico ou se ele vai sofrer um impeachment. Quando ele sair, precisa ser substituído por um presidente que tenha uma agenda política debatida e aprovada no processo eleitoral e se submeta, pelo menos, a esse débil mas importante instrumento de controle cidadão que é o voto.

Diretas-Já!


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