Folha de S. Paulo


Moisés

Leio toda noite a Bíblia que levei do hospital Albert Einstein quando estive internado. É o Velho Testamento. Aconselho sua leitura aos líderes exaustos por essa hora bíblica do Brasil. Encontrarão muita inspiração.

É belo ver o jovem Salomão quando Deus lhe diz que peça qualquer coisa, e ele pede sabedoria. Mas o meu favorito é Moisés. Nestes anos de vacas magras, ler e reler sobre Moisés guiando seu povo 40 anos pelo deserto é um exemplo a ser seguido. Diferentemente de Churchill, que tinha o dom da oratória e o rádio, Moisés era gago. O que o moveu é a força que move os grandes homens: a fé.

A fé em Deus, a fé num conjunto de ideias, a fé em propósitos, a fé num projeto político ou empresarial. Tudo o que o homem constrói foi antes construído dentro de sua alma. Eu digo por mim. O que me arranca da cama todo dia é o meu sonho de construir uma grande empresa, parte do sonho maior de construir um grande país.

Adoro biografias. Acabei de ler "Sobre Fibras e Gente", da Sextante, que conta a história do megaempreendedor Amos Genish. Ele criou a GVT, tornou-se um caso de sucesso mundial das telecomunicações e hoje preside a Telefônica/Vivo. Leia o livro e verá empreendedorismo e fé. Fé num conjunto de valores, num propósito, em ser diferente.

Os grandes líderes têm fé. Muitos, como Abilio Diniz, têm fé religiosa, fundamental para guiá-lo no cativeiro do sequestro, na ressurreição do Pão de Açúcar, nos momentos difíceis. Abilio é devoto de santa Rita, a santa das causas impossíveis. Vale a pena ler seu livro "Caminhos e Escolhas" e o livro sobre ele que a Sextante lançará.

Esses líderes, todos guiados pela fé, religiosa ou não, são Moisés. E a história do profeta mostra como a opinião pública oscila de 8 ao 80. Depois de Moisés libertá-los da escravidão no Egito e abrir o mar para livrá-los do faraó, os hebreus adoraram um bezerro de ouro enquanto ele estava no monte Sinai para descer com os dez mandamentos. No Datafolha do deserto, sua popularidade subia e descia, mas Moisés, com paciência de Jó, conduziu o povo à terra prometida.

Nós empresários estamos de novo na travessia do deserto. Mas aquele que tem fé em Deus ou em si encontra saídas onde não há saída.

Além da sabedoria de Salomão, peço a Deus que me dê fé. Um líder tem que ter fé e inocular essa fé nos liderados. A cultura são os dez mandamentos.

Os grandes líderes só falam de cultura pois sabem que, sem os dez mandamentos, a empresa vai adorar o bezerro de ouro –um atalho empresarial para o lucro fácil, que acaba com a companhia. São tentações comuns, só evitadas com cultura forte. E cultura é aquilo que você faz quando ninguém está olhando.

É verdade que Moisés tinha WhatsApp com Deus. Mas será que não temos? Minha sogra tem. Minha mulher tem.

Minha fé oscila. Às vezes fico sem sinal com Ele e peço o wi-fi da graça. A fé não é atingida intelectualmente. É uma graça divina para que os homens encontrem Deus.

Falo neste espaço empresarial sobre fé porque as grandes empresas foram construídas por seus Moisés –homens que tinham a sabedoria de Salomão e a paciência de Jó, que tinham empresas do tamanho de David e derrotaram empresas do tamanho de Golias. Ou empresas familiares que foram destruídas porque Caim brigou com Abel.

Nesses tempos difíceis, ler o Velho Testamento é um maná do céu para quem tem de ser Moisés todos os dias.


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