Folha de S. Paulo


Vamos insistir

Algumas pessoas seguem fazendo o bem mesmo depois de morrer.

A perda trágica de Eduardo Campos, ao menos nesses dias, teve o efeito de acalmar os ânimos da largada eleitoral. Sua morte deve dar e baixar o tom do começo da propaganda dos candidatos na TV –quando a campanha de fato entra na casa das pessoas.

Quem sabe a partir desse choque inicial conseguimos priorizar o debate das ideias e das soluções para o Brasil no debate eleitoral, um debate com menos calor e mais luz, menos emoção e mais razão, menos esperteza e mais clareza.

Eduardo Campos tinha uma visão moderna do país que nordestinos visionários sintetizam a partir da resistência ao inóspito. A visão de um Brasil democrático com economia de mercado e o compromisso, herdado do avô Miguel Arraes, de estar do lado dos necessitados.

O Brasil precisa disso: de compromisso e de visão. As eleições são o momento talhado na Constituição para formar um conjunto de ideias que apaixone o país. Um momento frequentemente perdido em disputas estéreis, de soma zero, inconsequentes.

Mas o choque da perda de Eduardo precisa ter consequências. Não podemos simplesmente perdê-lo.

Que sua morte facilite o que tenho chamado aqui de transição do marketing político para o marketing público. Enquanto o marketing político pensa só no eleitor, o marketing público vai além e pensa no cidadão. O marketing político faz campanha. O marketing público ajuda a pensar e a elaborar políticas públicas para serem aplicadas depois da campanha, para serem aplicadas para melhorar a vida dos cidadãos.

O marketing antigo pensa só na venda do produto. O marketing moderno foca a experiência da compra, os problemas do produto, a fidelização do consumidor. É uma visão maior, mais inclusiva e mais progressista, que respeita o público e entende que a força emana e depende dele.

Coco Chanel dizia que a moda não é algo que existe apenas nas roupas e nos acessórios. A moda, dizia ela, está ligada às ideias, à forma com que nós vivemos, ao que está acontecendo nas ruas.

Com todo o respeito, a política precisa descer do palanque e se embeber desse espírito: precisa estar presente nas ruas, na vida das pessoas, estar ligada às ideias e ao nosso tempo. Não podemos ter um encontro com a política a cada dois anos, e o resto da vida ficar reclamando do que elegemos.

Quem tem um pouco mais de cabelos brancos sabe que avançamos muito nos últimos 20 anos. Mas precisamos avançar muito mais para ter um país à altura dos brasileiros. Não conseguiremos percorrer esse caminho sem os políticos. A política, os políticos e seus partidos são incontornáveis em qualquer democracia. Mais ainda numa democracia de renda média com carga tributária de 35% do PIB.

Sem Eduardo e com Marina, nós seguimos tendo três políticos de bem liderando a corrida presidencial. Não tenho dúvida das boas intenções de Dilma, Aécio e Marina. Estão todos do lado do Brasil, darão o melhor pelo país. Mas o escolhido deve ser aquele ou aquela mais capaz de transformar boas intenções em boas ações.

Quando soube da morte de Eduardo, fui tomado de devastadora tristeza. Além da imensa tragédia humana, da morte de um pai querido deixando cinco filhos, um deles nascido há poucos meses, tivemos a tragédia cívica de perder uma liderança tão promissora, que fez trabalho muito importante em Pernambuco.

Ficou a sensação de um destino cortado num daqueles golpes da vida que não conseguimos nem aceitar nem compreender, mas contra o qual podemos reagir de forma digna e altiva: vamos fazer da saída de Eduardo uma porta para caminho mais iluminado e consequente na política.

É o que ele queria, é o que todo mundo de bem quer. Como ele disse na excelente entrevista ao "Jornal Nacional" um dia antes de partir: "Não vamos desistir do Brasil. É aqui onde vamos criar nossos filhos".

Esse slogan eu assino embaixo.

Vamos insistir no Brasil.


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