Folha de S. Paulo


O que está acontecendo conosco?

Gabo Morales - 6.jan.2011/Folhapress

O Natal e o Ano-Novo rolaram escada abaixo com pneumonias, gripes, plásticas de nariz, cachorros espantados. Foi barra pesada.

Sobrou alguma coisa em matéria de lição de vida? Ainda não deu tempo pra pensar. Só de fazer força para segurar na borda do prato de mingau para não afogar. A Net estará no ar?

Nunca está, acho que passarei a usar lápis e caderninho nesse ano que entra. A casa clama por pequenos consertos, um leve cheiro de mofo no ar, janelas abertas são portas para milhares de pernilongos sedentos. A nova trend é inglesa, Wimbledon, todos de raquete na mão, estalando os insetos no ar, ploct, ploct, churrasco brega.

Queria um ano novo que brilhasse em entendimento de política, economia, empreendedorismo, start-ups, pequenas empresas. Queria expor o peito no "Face" e confessar em quem votei, mas posso ter votado no meu inimigo mais ferrenho e depois...

Cansei de ficar sentada no muro, noutra partida de tênis esperando descobrir qual jornal é de esquerda, qual de direita. E quero entender pedra por pedra do Oriente Médio, minha maior
humilhação. Queria voltar aos tempos de moça, no outro dia mesmo, onde nada quase era vergonhoso. Acudiam-se os pobres, fazíamos sopão, recolhíamos agasalhos, levantávamos do chão o pobre Jacintho, éramos escoteiros e bandeirantes, sinto um vácuo no peito por não ter me dedicado aos menos felizes.

Queria desaprender política, economia, terror. O pouco que sei e que entendo. Não queria ter medo. Todos têm medo, não é engraçado.

Enjoei da imprensa que quando pega um ossinho faz como asas de galinha, chupa, chupa até brilhar em marfim e só consegue sorrir de novo com um tsunami de boas proporções. Eu entendo, traduzi por uns tempos as lutas no Oriente Médio e sentia um aperto no coração quando não se punha fogo numa cidade. Um assunto, um assunto! Depois que escrevi isso os assuntos continuaram em enxurrada infeliz. O que está acontecendo conosco?

Pior do que tudo foi ler o livro da Tati Bernardi que me recomendaram como uma comédia sem fim e chorar, e se reconhecer na mulher ansiosa. Comédia?

De comida andamos até bem demais. Chegou ao cúmulo, passou do limite, alcançou as estrelas. O difícil será em 2017 tirar o salto e vestir de novo as tamancas. O que ajudaremos a
fazer com alegria.

E não posso deixar de agradecer o Jabuti. Fiquei muito feliz. Quero outro.


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