Folha de S. Paulo


Bella, brava Bela

Estou comentando os programas de TV como uma telespectadora, uma pessoa que assiste TV e é muito ligada à comida. É claro que minha apreciação é extremamente subjetiva, ligada à domesticidade, à profissão, a ser mulher, dona de casa, ao meu gosto, às diferenças culturais.

A última leva de programas sobre comida estava calcada na negação. Sobre o que não comer. Lembro de uma nutricionista que examinava o que alguém comera no bandejão e depois comentava as cores, as proteínas, os carboidratos que o comedor escolhera, triste, com a cara séria. Havia também a inglesa com cara de fuinha que olhava com lupa desde as fezes do gordo até a comida de sua geladeira, mostrando quantos quilos de ruindade o cliente consumia por semana. Tivemos regimes com celebridades sendo pesadas na nossa frente e correndo o Brasil com seus quilos a menos.

Agora, neste ano, parece que a preferência vai para os professores passo a passo, cortando cebola e mexendo panela, mas de jeito positivo, como se comida fosse comida mesmo, e não remédio.

Por essas razões, quando passei pelo programa da Bela Gil nem quis assistir, aquela coisa de semivegetariana, ayuvérdica. Só a palavra "sustentável" já me arrepia, eu hein, dona Bela. Você aí e eu aqui com meu torresmo valente. Não, por favor, nada de radicalismos.

Um dia parei para ver um pouco, porque toda menina baiana tem um santo que Deus dá. E fui percebendo o quanto ela gostava de comer, meio caminho andado para um bom show de TV. Vê-se que ela sabe cozinhar e de um jeito bonito te convida a gostar também. Não tem dificuldade alguma, essa é uma das chaves para o show de sucesso pois nos refletimos nele. E a graça, a simpatia e a generosidade. A sabedoria também. Estudou e estuda bastante para saber das coisas.

É bonita, de uma naturalidade a toda prova, o que deve tornar o programa mais interessante. Cozinha mesmo, sem truques, mão na massa, prestando atenção, mostrando que já fez muito aquilo na vida e ainda faz. Adora quando sai legal!

Bela Gil nem precisaria dos convidados, mas recebe bem, com prazer, e o compartilhar a comida faz parte de sua filosofia. Os convidados, por mais famosos que sejam, não conhecem muito comida moderna, engraçado! Quinua? Erva-doce? Inhame? Leite de castanhas...

Chega ao programa pelo caminho de uma horta e é claro que só usa produtos da época, enquanto o tempo não trouxer teu abacate, amanhecerá tomate e anoitecerá mamão. Ela não se entusiasma com carne. Se os outros quiserem comer, como sua própria filha, que remédio.

Não é daquelas vegetarianas duras, é uma baianinha linda, de flor no cabelo e vestidos leves e um bocão cheio de fome. Gosta sensualmente da cozinha que faz.

Garanto que se precisar traçar uma pizza, vai ser sem remorso nenhum. No dia seguinte come mais uma colher de aveia. Enquanto durar o apreço das pessoas à comida saudável, ela vai fazer sucesso merecido. É um nicho que se deve respeitar. Tudo de uma simplicidade inacreditável, fácil de fazer... Nesse itinerário de leveza pelo ar.... Gostoso. Programa bem feito.

ninahorta@uol.com.br


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