Folha de S. Paulo


As (muitas) vantagens do delivery

Vamos falar a mais pura das verdades. Não dá coragem de cozinhar no calorão. Ir ao supermercado já é um sacrifício. Ir ao pequeno fazendeiro mais próximo, como mandaria o figurino, é impensável. Joguemo-nos numa lata de sardinha com rodelas de cebola.

Só de pensar no menu já dá preguiça. O sol a pino, o trânsito até o supermercado, a fila. E por mais organizada que a pessoa seja vai sobrar panela para lavar e pratos para guardar e copos para brilhar.
Assim por escrito é fácil, mas o melhor mesmo é pedir um delivéri, como diz o pai de uma amiga minha. Delivéri para na porta, já dá moleza de atender a campainha, vai ter qualquer coisa errada, com certeza esqueceram a Coca outra vez.

Confesso que já fui a mais prendada das donas de casa, delivéri logo ficava com cara de feito em casa, flores na mesa, pratos bonitos. Hoje, por mim, não haveria nem pratos, nem mesa. Comida no próprio saco ou na caixinha, tudo bem. E uma boa rede e um abanico.

Quantas e quantas coisas se podem fazer em vez de cozinhar no verão. Primeira coisa, não fazer nada. Segunda, assistir reality show de comida, tem de tudo, desde a Rita Lobo, linda, fazendo comida de verdade (mas até ela põe o rosto bem na frente do freezer para refrescar e para nos animar a cozinhar com aquele vento que sai de lá).

E tem aqueles homens fingidos que vão para onde Judas perdeu as botas, mato adentro no fim do mundo, vestem uns caras de índios e se põem a cozinhar testículos de bode servidos na folha de bananeira. Acham que me enganam!

E ler sobre comida alimenta mais ainda quando o livro é bom. Por sinal comprei um sobre testículos. E quem tem tempo de comer quando o gênero pegou fogo e são publicados cerca de 25 mil livros de comida por ano? Acho que a moda chegou para ficar e, em vez de me interrogar, ansiosa, o que foi, o que foi que aconteceu, por que não se fala noutro assunto? Vou fazer o contrário. E por que não livros sobre comida? Mais interessante do que muitos assuntos escabrosos que andam por aí. Vital, para começar.

Acabamos de pedir um lanche. Uma salada do chef, bem fresca, com folhas, presunto, queijo em bolinhas, ovo cozido e uma azeitona só, mas bem grande, azeitona para uma salada inteira.

De acompanhamento, bolinhos de arroz ainda quentes, crocantes, com o recheio nem mole nem duro demais.
E uma lata de refrigerante diet. Não é o bastante? E depois, o melhor vem depois, o maravilhoso vem depois! Lixo! O melhor do delivéri é a hora de colocar todas as pequenas caixas já usadas na sacola do restaurante que fez a comida e... supremo prazer, lixo!

Nem uma pequena panela para lavar. Já imaginaram nessa refeição simplória quanta coisa haveria na cozinha? Limpar todas as verduras, cortar o presunto muito fino, cozinhar os ovos, equilibrar a quantidade do queijo, fazer o molho da salada e o relish.

Ah, esqueci da panela do arroz do bolinho. E moer o próprio e, pior de tudo, fritar! Fritar com os pernilongos rondando e a água saindo pouquinha da torneira. Não. Não. Não! Decididamente é com o delivéri.

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