Folha de S. Paulo


A ordem dos fatores alterou o produto fiscal

Mateus Bonomi/Agif/Folhapress
Henrique Meirelles, Moreira Franco, Michel Temer e Eliseu Padilha na reunião de líderes empresariais sobre a reforma da Previdência
Henrique Meirelles, Moreira Franco, Michel Temer e Eliseu Padilha na reunião de líderes empresariais sobre a reforma da Previdência

O fracasso do governo Temer em aprovar a reforma da Previdência em 2017 não pode ser colocado somente na conta do Congresso.

Houve erro grave de estratégia por parte da equipe econômica. Em vez de enfrentar o principal problema orçamentário em primeiro lugar, gastou-se capital político para aprovar um teto de gasto inadequado, que já seria insustentável mesmo se a reforma fosse aprovada. Nesse caso, a ordem dos fatores alterou o produto da estratégia fiscal do governo.

Nossa história econômica indica que mudanças de regras de aposentadoria acontecem geralmente nos primeiros dois anos de mandato. Foi assim com as reformas realizadas pelo presidente Lula, em 2003, e pela presidente Dilma, em 2012 e 2015.

A reforma encaminhada por Fernando Henrique Cardoso no final de seu primeiro mandato já não teve tanto sucesso, pois acabou em remendo temporário —o fator previdenciário— quando o governo perdeu a votação da idade mínima por apenas um voto. Dificilmente se aprova esse tipo de mudança com sucesso em final de mandato, ainda mais com um presidente impopular como Temer.

No início de 2016, o segundo governo Dilma reformulou sua estratégia fiscal e colocou a reforma da Previdência como medida central para controlar o crescimento do gasto obrigatório da União. Naquele momento, a presidente chegou até a dar uma entrevista dizendo que o governo teria que "encarar a reforma da Previdência".

A lógica era flexibilizar a política fiscal no curto prazo, com aumento do deficit primário para estabilizar a renda e o emprego. Ao mesmo tempo, seriam encaminhadas reformas de longo prazo, na receita e na despesa, para recuperar o reequilíbrio orçamentário. Ajuste fiscal sem austericídio, como foi feito com sucesso nos Estados Unidos, na Alemanha e em outras economias (Clinton e Kohl nos anos 1990, Obama e Portugal recentemente).

A proposta de flexibilização fiscal de Dilma foi ampliada e aprovada pelo governo Temer, após o golpe de maio de 2016. Porém, em vez de prosseguir na direção correta e enfrentar a questão da Previdência, a nova equipe econômica resolveu criar um teto de gastos para... os próximos governos!

Em uma iniciativa que deveria ganhar o Oscar de oportunismo político, o governo Temer elevou o gasto substancialmente em 2016 e estabeleceu um limite para o seu crescimento real que só terá efeitos mais restritivos a partir de 2019.

Agora, a equipe econômica insiste em dizer corretamente e tardiamente que a reforma da Previdência é urgente, sem perceber que isso contradiz sua própria estratégia fiscal.

Se é urgente, por que não foi prioridade antes? Por que se apostou no teto de gastos, depois na reforma trabalhista, deixando a reforma da Previdência para depois?

Oportunismo é a resposta mais simples e provável, mas pode ser apenas um erro dos fiscalistas de planilha do Ministério da Fazenda.

Na prática, o teto de gastos não resolveu o problema fiscal, pois todos sabem que o próximo governo terá que revisar tal regra, além de enfrentar o problema da Previdência e da folha salarial dos servidores.

Apesar do discurso oficial da equipe econômica, os fatos demonstram que as ações do governo Temer se concentram na antecipação de receitas e no adiamento de investimentos para fechar as contas de 2017 e 2018, enquanto se empurra o ajuste estrutural do Orçamento para o próximo presidente.


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