Folha de S. Paulo


Taxa de juro, rentabilidade e credibilidade

Alan Marques/Folhapress
Presidente do BC, Ilan Goldfajn, comanda a reunião do Copom
O presidente do BC, Ilan Goldfajn, comanda reunião do Copom

A taxa SELIC deve cair para 7,25% anuais no fim deste ano.

Apesar dessa redução, o pagamento de juros reais pelo governo aumentou significativamente desde o final de 2015. Para explicar como isso aconteceu, é preciso relembrar dois conceitos de taxa de juro real utilizados em economia.

A taxa esperada é a taxa de juro projetada para o futuro, descontada pela expectativa de inflação para o mesmo prazo. Essa é a variável mais relevante para o planejamento de investidores e consumidores. Considerando o prazo de um ano, a taxa real esperada caiu para aproximadamente 3% ao ano recentemente.

Como qualquer projeção, a taxa esperada pode ou não se verificar.

A taxa efetiva é a taxa de juro praticada no passado, descontada pela inflação do mesmo período. Essa é a variável mais relevante para a distribuição de renda, pois representa o quanto um devedor pagou ao seu credor em termos reais.

A taxa real efetiva subiu para aproximadamente 9% anuais recentemente, pois a inflação caiu mais rápido do que a Selic nos últimos meses.

A evolução dessas duas taxas pode ser consultada no "Monitor de Taxas de Juros", do Grupo de Economia Política da UnB, que também inclui uma contabilidade dos juros pagos pelo governo. Por limite de espaço, apresentarei somente esse último ponto.

Quando excluímos o resultado dos swaps cambiais da conta, os juros líquidos pagos pelo setor público atingiram 7% do PIB nos últimos 12 meses. Esse total pode ser dividido em três componentes.

Primeiro, parte do pagamento de juros representa o "custo de carteira" do governo, isto é, o fato de o governo emitir títulos e adquirir ativos com uma taxa de remuneração diferente da taxa básica de juro.

No Brasil, esse custo decorre principalmente da acumulação de ativos com rendimento inferior à Selic, como reservas internacionais e empréstimos ao BNDES. Do pagamento total de 7% do PIB mencionado acima, 2,2% do PIB deve-se ao custo de carteira.

Segundo, parte dos juros pagos pelo setor público apenas repõe a variação de preços. A rápida redução da inflação fez com que a "correção monetária" sobre a dívida líquida fosse de apenas 1,1% do PIB nos últimos 12 meses (o que é positivo).

Por fim, o terceiro componente é o juro real sobre a dívida líquida, que atingiu 3,7% do PIB nos últimos 12 meses. Esse valor representa uma elevação de três pontos percentuais do PIB, ou R$ 192 bilhões com base no PIB deste ano, em relação ao verificado em 2015.

O aumento dos juros reais pagos pelo governo indica que, pelo menos até agora, a melhora no ambiente macroeconômico foi conquistada por um preço bem elevado. Na lógica de curto prazo do mercado financeiro, é crível o que é rentável, mesmo que não seja sustentável.

Hoje as expectativas de mercado apontam para uma Selic de 8% ao ano no médio prazo. Caso isso se confirme e a inflação fique na meta de 4% anuais, os juros reais pagos pelo governo cairão para 2% do PIB até 2019.

Será que o mercado ficará satisfeito com a menor rentabilidade que ele mesmo projeta? Espero que sim, e esse será um dos grandes testes da política econômica dos próximos anos.

Porém, caso a taxa real efetiva não caia como esperado, a conclusão inevitável é que "aumento de credibilidade" é apenas um nome fantasia para "aumento de rentabilidade" sobre a dívida pública, ou seja, que o rentismo continua firme e forte no Brasil.


Endereço da página: