Folha de S. Paulo


Esse cara sou eu

Na semana passada, o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), afirmou que era preciso alguém capaz de reunificar as forças políticas para fugir da crise.

E quem podia imaginar que o correligionário Renan Calheiros (PMDB-AL) reivindicaria esse papel?

Foi do Senado a iniciativa de propor uma agenda anticrise ao Palácio do Planalto. Na prática, governou pelo governo. Mas, diante da turbulência atual, nem o próprio Executivo se importa em disputar paternidades agora. É mais jogo sair do caos e não ser o dono da bola.

Ao apresentar uma "agenda para o Brasil", com a concordância dos ministros de Dilma Rousseff em boa parte dos pontos, o peemedebista deu um baita balão de oxigênio à presidente da República. Isso sem falar no efeito colateral: tentar se diferenciar do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que vem pautando inúmeros projetos de forte impacto fiscal para impor derrotas sucessivas ao Palácio do Planalto.

De fora da costura de uma pauta comum, Cunha reagiu nesta terça-feira. Disse que o sistema é "bicameral" e que nada passa em caráter definitivo sem sua participação. Isso é verdade. Entretanto, ao menos por ora, Cunha perdeu a posse da bola.

Enquanto a Câmara segue cravada de minas, o Senado aos poucos se transforma na trincheira onde Dilma pode transitar com menos riscos de explodir. Afinal, um eventual processo de impeachment é deflagrado pelos deputados, mas só tem êxito se os senadores assim quiserem.

Eis outro efeito colateral. Ao assumir a iniciativa de uma agenda para destravar negócios, o presidente do Senado atraiu para o seu lado a plateia empresarial já queixosa da hiperatividade da Câmara. Renan tenta sair do foco da Lava Jato, ao mesmo tempo em que se apresenta como alguém capaz de dar uma resposta à crise política em muito alimentada pela crise econômica.

Exageros à parte, seus movimentos lembram aquele sucesso novelístico do rei Roberto Carlos, sobre um homem que se coloca em cena para o que "der e vier".

Uma estrofe da canção serve até de metáfora para a boia que ele acaba de lançar à presidente Dilma Rousseff.

"O cara que pega você pelo braço / Esbarra em quem for que interrompa seus passos [...] / Esse cara sou eu."


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