Folha de S. Paulo


Questão de Estilo

Lula e Dilma têm estilos bem diferentes de decidir.

Apesar de estar fora do sindicalismo há décadas, as reuniões do ex-presidente no governo mais pareciam assembleias de trabalhadores.

Em geral, Lula jogava a isca do debate na arena e deixava que seus assessores se "matassem". Dali, o petista extraía a "verdade" da discussão. Só falava, e entrava no jogo, para definir.

O processo era desgastante, dizem antigos interlocutores, mas tinha ritmo.

Não raro, Lula promovia disputa de ideias tão tensas entre ministros que algumas delas extrapolavam o bastidor e estampavam o noticiário dos jornais.

Nada melhor para ilustrar esses momentos do que o cabo de guerra entre Guido Mantega (Fazenda) e Henrique Meirelles (à época presidente do Banco Central). Ora Lula acatava a proposta de um, ora a de outro.

Quando o debate se transformava em guerra interna, ele entrava para acalmar seus comandados.

Ao contrário do que muitos imaginam, o ex-presidente distribuía broncas. Até xingava com palavrões. Depois, contudo, afagava o subordinado ao perceber o exagero. Em geral, ele não se incomodava com vazamentos das reuniões para a imprensa. Muitas vezes, aliás, ele próprio autorizava a circulação da informação para testar a aderência de uma ou outra medida nos meios de comunicação.

Com Dilma Rousseff, a dinâmica é oposta. Primeiro porque a petista domina todas as reuniões; costuma falar mais que seus funcionários.

Nos encontros, ganha mais quem concorda com a chefe. As disputas entre ministros e técnicos são constantes, como antes, mas irritam a presidente quando se tornam públicas. Guerrilheira na juventude, Dilma trouxe muito dos costumes de seu tempo para o ritmo do governo.

Detesta, em letras garrafais, o vazamento de dados ou de bastidores dos encontros de seu governo. E manda apurar para saber a identidade do "traidor".

O gesto é até compreensível. No regime militar, vazar uma informação significava, muitas vezes, ver um companheiro desaparecido, capturado, torturado e, até, morto. Por isso Dilma Rousseff não tolera a prática, ainda que de consequência infinitamente menos drástica nos dias de hoje.

Para evitar que conteúdos sigilosos circulem por aí, a petista costuma contar aos subordinados informações parciais. Quem sabe A, não sabe B. E, assim, ninguém controla, além dela e outros poucos, a totalidade da informação.

O estilo gera um clima de desconfiança constante. Assim como abre brechas para acusações de um colega ao outro para agradar a quem manda no governo. As decisões são mais solitárias, e todas dependem do aval da chefe.

Quando dá broncas, e não são poucas, Dilma raramente pede desculpas. Prefere fingir que nada ocorreu. Como afago, costuma convidar o assessor para uma viagem oficial ou chamá-lo para alguma reunião técnica como sinal de carinho.

Lula e Dilma são resultados de sua época. Seus governos também.


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