Folha de S. Paulo


Truco?

Eis o que diz um interlocutor frequente no gabinete presidencial: Dilma Rousseff torce, sim, o nariz para a proposta de reajuste automático do combustível feita pela Petrobras. Teme pressão inflacionária e risco de indexação. Mas não vetou a discussão uma fórmula.

Quando Guido Mantega pisou na reunião do conselho de administração da estatal, na semana retrasada, não imaginava que sairia de lá com o ônus de ter de deliberar, já em novembro, sobre uma política de reajuste independente da vontade do governo. Quase uma "Lei Aáurea". Ou, como preferem alguns, a "Lei Graça".

Não que a ideia do "gatilho" fosse nova; há meses a companhia discutia o assunto. Mantega sequer pôde alegar surpresa: dias antes, a presidente da gigante do petróleo desembarcara em Brasília com a missão de avisá-lo sobre o plano.

Talvez Mantega tenha achado que era blefe de Graça Foster. Afinal, pressão por aumento, sistemático ou não, sempre houve por parte da diretoria. Mas tudo, até aqui, era resolvido na camaradagem ou na base da pura subordinação à vontade do sócio controlador.

Cansada dos acertos extraoficiais, seguidos de tradicionais indefinições sobre o esperado aumento nos preços da gasolina e do diesel, a diretoria decidiu mudar de método. Registrou a sugestão em ata e, assim, tornou a proposta pública. Criou-se uma armadilha.

Se Dilma Rousseff não topar um novo modelo de reajuste, será responsabilizada pelo destino da empresa, ameaçada de perder o tal grau de investimento e, assim, acentuar seu problema de caixa em pleno ano eleitoral.

O modelo de reajuste tornou-se uma novela com capítulos cheios de interrogação. Para citar só alguns: Mantega não acreditou que a diretoria fosse tornar o plano oficial (sua reação durante a fatídica reunião sinalizava espanto)? Graça Foster, a despeito da relação estreita com a chefe, emparedou o governo? E Dilma, aprovou a fórmula e a forma como tudo transcorreu?

Sabe-se que a presidente da República tem horror à insubordinação (até demitiu um chanceler por este ter sido alvo de quebra de hierarquia).
Tivesse aprovado o plano de reajuste, como muito se escreveu, Guido Mantega precisaria pedir mais tempo para "estudar" o modelo? Se fosse assim, o registro em ata para pressionar o sócio federal seria desnecessário. Mais: qual governo abre mão facilmente do poder de decidir sobre o aumento da gasolina?

Dilma não deve ter gostado de ver diretores da empresa mostrando tensão pelos jornais. A própria chefe da estatal veio com uma declaração esquisita. Ao "Estado de S.Paulo", saiu-se com um misterioso "se eu não der resultado, me demite."

Raro ver manifestação assim em um governo famoso pelo estilo linha dura.

Das duas, uma. Ou Graça trucou, publicamente, a amiga, ou deu ares de independência à Petrobras combinada com a chefe.

Parece que há muito óleo pesado correndo solto nesse poço.


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