Folha de S. Paulo


"Quero voltar às origens e dar voz ao espectador", diz Serginho Groisman sobre nova fase do "Altas Horas"

"Altas horas" de verdade o apresentador Serginho Groisman só tem enfrentado em casa. Pai aos 64 anos, ele e a mulher, a dentista Fernanda Molina Groisman, ainda acordam pelo menos cinco vezes de madrugada para cuidar do filho Thomas, de 1 ano.

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Desde 2013 exibido mais cedo, por volta das 23h, o "Altas Horas", programa de Serginho na Globo, viu a audiência se fixar no patamar de 11 pontos no Ibope. A média é maior que a alcançada quando ia ao ar após a 1h, no horário que deu origem ao nome e ao slogan da atração, o "Vida inteligente na madrugada".

"Agora deveria ser 'Vida inteligente nas noites de sábado', mas ele é meio longo, não me convence ainda", diz o apresentador ao repórter Joelmir Tavares em sua sala nos bastidores, horas antes de começar mais uma gravação.

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Jornalista que na juventude chegou a estudar direito e quase fez cinema, Serginho está na Globo desde 2000, depois de trabalhar na Gazeta, na Cultura e no SBT, sempre como diretor de seu próprio programa. "Quando entro para fazer, eu já sei de tudo: convidados, banda, iluminação, cenário, técnica, som."

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Por decisão dele, o "Altas Horas" tenta no momento voltar às origens. "Quando a gente passou a entrar colado com o 'Zorra', eu dei uma, entre aspas, 'popularizada' no programa. Este ano resolvi voltar a fazer aquilo que eu realmente acho que na televisão eu me prontifiquei a fazer. Primeiro, dar voz ao espectador. Segundo, ter convidados, principalmente musicais, que normalmente não aparecem muito em TV."

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Cita Djavan, Paulinho da Viola, Ney Matogrosso, Caetano Veloso e Gilberto Gil entre as atrações que passaram pelo palco recentemente. O programa também foi um dos últimos que receberam Cauby Peixoto, morto em maio. "Não que a gente não goste, não respeite outros estilos, mas é dar espaço para o que pouco tem na televisão. Não vou deixar de trazer sertanejo ou samba, mas já não com tanta frequência."

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Levar pessoas conhecidas, conta, foi uma estratégia para manter o público do "Zorra" diante da TV e se fixar no horário. "Mas mesmo nessa época, se você procurar, não acha um programa que não tenha tido uma coisa diferente", diz Serginho, que persegue um ideal: "Não importa quem você traz, importa o que você faz com a pessoa".

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Numa discussão sobre feminismo em 2014 aconteceu, como ele diz, uma "conversa mais forte" entre as cantoras Anitta e Pitty -as duas discordaram durante um debate sobre o papel da mulher e o caso gerou grande repercussão em redes sociais. "Se você coloca questões que normalmente a pessoa não enfrenta, você vai ter um outro lado, até diferente, dela", afirma o apresentador.

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Vale tudo, menos "a exploração humana", ele acredita. "Uma coisa é você discutir um tema, que às vezes é um tema difícil. Mas nunca explorar aquela pessoa, levar ao choro, naquele ponto de procurar o relato da tragédia, da intimidade, pessoas doentes, essas coisas."

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"O legal", diz, "é o imprevisível. A plateia falando, mudando o rumo do programa. É um pouco um jogo".

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E deixa sua sala para "jogar" mais uma vez, numa tarde de quinta-feira, no prédio da Globo em São Paulo. Passa numa cabine para aprovar a versão final de um depoimento gravado pelo cantor Samuel Rosa, do Skank, seu amigo e padrinho de Thomas. Na área de operações, com várias telas, acerta os últimos detalhes com a equipe, numa conversa que é quase um papo.

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A caminho do camarim, no corredor, cumprimenta Carlos Tramontina, apresentador do "SPTV", e logo está diante de várias peças de roupa e tênis à sua disposição. Só pega uma camisa. E decide, como quase sempre faz, ficar com a própria calça e o tênis que está usando.

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Os potinhos de maquiagem na bancada também ficam intactos. "A vantagem é que as pessoas quando me encontram na rua não se surpreendem [risos]." Ele chegou a experimentar se maquiar quando o programa passou a ser feito em alta definição, mas não gostou e continuou entrando de cara limpa.

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Chega ao estúdio e passa 20 minutos conversando com a plateia para deixá-la mais à vontade. Com um grupo de Rio Claro (SP), brinca: "Vocês saíram de lá e a cidade ficou vazia, né?!". Os alunos de uma faculdade de Franca (SP), conhecida pelas fábricas de calçados, levam um par de sapatos de presente para ele: "Essa é a melhor escola que veio hoje aqui", diverte-se, provocando risos.

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Quando a gravação começa, vai de uma vez, sem cortes. Aos poucos, vão entrando os três atores convidados do dia, duas bandas, a sexóloga Laura Muller, que responde a perguntas, e o humorista Marco Luque, com seus personagens. Três horas depois, já no fim dos trabalhos, Serginho solta a deixa que virou bordão nos últimos tempos: "Thomas, tô indo pra casa!".

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"As pessoas me falam: 'O programa tá tão bom. Você tá bem também'. Tem muito a ver com ele [Thomas], muito. Porque para mim é um amor novo. É um sentimento novo que nasce. Quem é mãe e pai sabe o que eu tô falando."

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O menino, conta o pai, também está numa fase de descobertas. "Ontem eu cheguei e ele tava com o controle da cortina na mão. Eu sempre peguei o dedinho dele e fiquei apertando. E agora ele maneja o sobe e desce sozinho."

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Thomas, que nunca foi exibido pelos pais em público, "adora gente". "E isso eu acho que tem a ver comigo. Ele é uma pessoa muito bacana, tem um caráter ótimo [risos]. Nem vou falar o quanto ele é bonito." É por ele que Serginho volta para casa.


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