Na sala, os golden retriever Tommy e Dog fazem festa com a chegada de sua dona. Na cozinha, Graça finaliza o jantar e brinca ao falar da patroa: "Ela fica me exibindo, me mostrando nas revistas". Ela está há 25 anos na casa de Gloria Coelho.
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À mesa de jantar, a estilista de 63 anos, que completou quatro décadas de carreira no ano passado, propõe um brinde à repórter Eliane Trindade. "À vida! Saúde e amor."
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Os temas permeiam uma hora e meia de um papo com muitas risadas, em uma viagem pelo mundo muito particular de uma criadora de moda que apela para a física quântica e manuais de autoajuda para falar de suas dores, como o fim do casamento com o também estilista Reinaldo Lourenço, pai de seu filho, Pedro Lourenço, 24.
CABALA E ASTROLOGIA
"Tem uma coisa na cabala [escola de pensamento judaico] que adoro. Ela diz que o normal é que tudo dê certo pra gente aqui embaixo. Aí, vêm os medos e atrapalham. Quando me separei, como ficava muito tempo só, comecei a aprender física quântica e astronomia na internet, que me ajudaram muito."
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"Você sabe o que é quântico? É a menor partícula do universo. Se você quiser que elas andem em ondas, elas andam. Se quiser que passem por um buraquinho, elas passam. É você quem manda na tua vida. Você pode criar um futuro maravilhoso, se pensar coisas boas."
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"Se estou com medo, penso que tô criando um mundo lindo pra mim. Repito: tudo é perfeito, pleno e completo. Se estou infeliz é o mesmo. Felicidade pra mim é olhar o céu, entrar no mar, sentir o vento no rosto. Acham que sou louca, pois quando olho para as estrelas fico falando: 'Te amo, Saturno'."
FIM DO CASAMENTO
"Reinado e eu ficamos casados 27 anos. No primeiro mês de separação, sofri muito. Chorava o dia inteiro, não conseguia trabalhar. Emagreci 20 kg. Mulher quando fica sozinha emagrece, começa a cuidar mais dela mesma. Foi ainda mais difícil, pois minha mãe morreu dias depois. Hoje, não tenho mais amor pelo Reinaldo como marido. É um grande amigo, que está sempre junto, dá conselhos."
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"Quem me ajudou foi a Graça, minha cozinheira. Ela dizia: 'Dona Gloria, deixa o seu Reinaldo ser feliz' [fala com sotaque nordestino]. No começo, eu fiquei mal, porque sou muito careta. Depois, eu o compreendi. Quero que ele seja feliz. De verdade."
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"Eu me tratei com o livro de autoajuda 'Você Pode Curar sua Vida', da Louise Hay. Funcionou. Eu ia para a cama, chorava e ficava lendo todas as meditações. E aí dormia. Resumindo: não sou uma pessoa de ficar sofrendo."
SOLTEIRA DE NOVO
"Não estou namorando. Sou difícil. Tem gente que acha graça em um monte de gente. Fica. Eu não. Tenho que amar. Não faço sexo, faço amor. É de personalidade. Sou caretérrima. Só sou louca na criação. Mas estou em paz. Se chegar alguém, agradeço a Deus. Por isso, vou falar para o universo: 'É fácil'. Aí, vai acontecer."
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"Estou no Tinder [aplicativo de paquera que facilita encontros], me divirto. Uma vez, em Paris, em cinco minutos apareceram 15 meninos lindos. Brinquei que gostava dos 15 e eles vieram bater papo no chat. Mas não falei pessoalmente com nenhum. Uma amiga namora sério com um cara que conheceu assim."
VELHO E NOVO
"Sigo um médico francês há 30 anos. É um fitoterapeuta, que faz controle biológico para evitar o envelhecimento. Eu me preparei para esse momento a vida inteira. Então, acho uma delícia envelhecer [risos]. Você vai para a fila dos idosos no banco, paga meia-entrada no cinema. Depois que me contaram as vantagens, comecei a gostar."
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"Aos 12 anos, Pedro fazia moda achando que estava brincando, mas pediu para fazer o desfile da Carlota Joaquina quando a estilista deixou a marca. A fábrica era o quintal da nossa casa. Depois da escola, ele ia pra máquina e costurava o tempo inteiro. Aos 6, a gente já montava passarela na sala. Era uma brincadeira caríssima [risos]."
CRISE NA MODA
"Existo há 40 anos no mercado, pois sou criativa. Tem uma cultura no Brasil que nos prejudica. Muita gente não é séria. É preciso ter controle, sistema. Enquanto nós temos 500 anos, os romanos 2.000 anos antes de Cristo já costuravam a seda. Além de jovens, fomos colonizados pelos portugueses, que trouxeram a escória das prisões para cá. A corte também veio e saqueou tudo. Temos um problema, concorda? E não só na moda
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"Estamos nos anos 1930 tecnologicamente. Na formação de mão de obra também. Mas qualidade a gente inventa. Em vez de alta tecnologia, criamos uma 'low tech' bacana na moda. Crio um acabamento que funciona. Fico inventando detalhes para que a roupa cresça e seja uma expressão bonita."
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"Quando a Clô [Orozco, estilista que se suicidou em março de 2013] faleceu, fiquei de cama. Era uma amiga querida. A crise [nos negócios] existia mais forte na cabeça dela. Reinaldo falava para ela fazer consultoria, palestra. Eu faço. Assino o conceito do primeiro hotel fashion do Rio. Quero fazer mais. Mas ela ficava mal de estar devendo. Como não podia controlar, era seguir adiante. Sabe quantas vezes o Walt Disney faliu? Oito. O segredo é se reinventar."
CUSTO BRASIL
"Mantemos um apartamento alugado em Paris para o Pedro. Lá, pagamos 25 euros por mês para ter internet, televisão e telefone. Menos de R$ 100. Aqui, tenho o mesmo pacote e custa R$ 890."
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"O governo não ajuda. É imposto sobre imposto. O cara vai pedir dinheiro no banco porque está endividado e tem que pagar IOF. Pago todos os impostos aqui e aí chego em Paris e pago IOF de novo porque comi um hambúrguer e paguei no cartão. É justo? Por que a gente não faz como os franceses e corta a cabeça [dos governantes, como na Revolução Francesa]?"
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"'O Diabo Veste Prada' é um exemplo para o governo. Se fosse assim [duro no comando], o país tava ótimo. Anna Wintour [a temida diretora da 'Vogue América', que inspirou a personagem do filme] para presidente! Tudo ia funcionar. Na métrica. Com rigor. Gosto da exigência, da excelência. Passo isso para quem trabalha comigo."
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"Brinco com meus funcionários: 'Escravos da G, jogavam caxangá...' [canta no ritmo da cantiga 'Escravos de Jó']. Tem que pensar o dia inteiro em moda. Tem uma logística imensa. Um tecido vem da Coreia, outro da China ou da França. A estamparia vai para o interior. O fio vem do Sul. Temos que fazer mágica para tudo funcionar."
JEITO GLORIA DE SER
"Mas se você tem medo, atrai o medo, diz a física quântica. Uma vez, eu tava indo para uma exposição do Paulo von Poser [artista plástico], falando ao telefone no carro. Veio um menino com uma arma: 'Passa o celular!'. Eu dei o grito do 'Avatar', aquele do filme, que adoro: 'Ahhhhhh!' [grita]. Ele saiu correndo. Tá correndo até hoje. Minha amiga quase desmaiou do lado. Foi uma reação bem selvagem. Sou meio louquinha."