É na rua Rego Freitas, no centro de São Paulo, com alguns travestis por perto ao cair da tarde, que a escritora, atriz e apresentadora Fernanda Young, 43, recebe o repórter Morris Kachani. "Aqui eu me sinto segura", vai logo dizendo, para emendar, desculpando-se pelo atraso de cerca de 20 minutos: "É que eu me perdi. Sou disléxica, e isso não é charme".
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O encontro se dá em frente ao prédio onde ela mantém seu aconchegante estúdio de trabalho. As referências à pintora mexicana Frida Kahlo são várias. Há uma cama, a mesa de trabalho, e acima de sua cabeceira um retrato de Ernest Hemingway autografado pelo escritor. Young diz ter lido a obra completa de Freud e Schopenhauer.
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Este parecia ser um ano promissor para ela e Alexandre Machado, 53, seu marido e parceiro, com quem cria roteiros para a TV Globo e o GNT. Sucessos como "Os Normais" são de sua lavra.
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"O Dentista Mascarado", roteiro do casal que marcaria a estreia de Marcelo Adnet, foi a grande aposta da emissora carioca no primeiro semestre. Mas a audiência deixou a desejar. O seriado se manteve inicialmente na média de 17 pontos do ibope, e depois caiu para 12.
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As críticas também não ajudaram. O humorístico foi qualificado de vulgar, sem graça, hierarquizado e com o talento de improvisação de Adnet subjugado pelo script.
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"Não foi um fracasso. Me nego", afirma Young. Ela elogia Adnet: "Um gênio, da categoria de Jô ou Chico Anysio". Reclama da "sobrecarga enorme de virulência e inveja". E diz que "o ibope é uma burrice. Hoje só temos essa medida, que infelizmente é financeira. Toda pesquisa é cretina, porque as pessoas mentem".
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"O programa não tinha o tom do texto. TV não se faz individualmente, você não tem autoria nenhuma."
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Um dia depois, Alexandre Machado receberia a reportagem no apartamento dúplex do casal, em Higienópolis. "Obviamente foi decepcionante", afirmou. "Não foi a primeira vez que fizemos algo estranho." Ele cita as séries "Os Aspones" e "O Sistema". "Não acredito que houve erro. Houve talvez uma mistura de gêneros de humor, da baixaria à piada esperta, que pode ter confundido."
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Alexandre e Fernanda trabalham em horários diferentes, em lugares diferentes, e até em camas diferentes eles dormem. Em geral, quem finaliza os textos é ele. "Sou mais ligado na matemática dos roteiros, ela não tem muita paciência para isso."
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Fernanda "sempre foi esquisita", diz. "Hoje em dia é uma lady, comparada com quando a conheci, há 20 anos. O pessoal tinha medo dela". O primeiro encontro foi na boate Crepúsculo de Cubatão, de Ronald Biggs. Alexandre costumava lhe atribuir notas -no jeito de se vestir, em alguma atuação etc.
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Ela diz ter "obras de arte" no guarda-roupa, como um vestido de Alexandre McQueen. "Não visto nada que seja descartável, não sigo tendências." No corpo, a escritora tem 46 imagens tatuadas.
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"Por que sou controversa e não símbolo sexual?", pergunta. "Quero fazer os outros rirem, debochando de minha própria cara", responde.
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Ela e Alexandre têm duas filhas gêmeas, Cecilia Madonna e Estela Max, e os caçulas John Gopala e Catarina Lakshimi, que são adotados. Os nomes dos quatro são homenagens a Santa Cecília, Paul McCartney, Lennon, Santa Catarina e "divindades hinduístas". Ser mãe, comenta, é duro. "Exijo indenização. Por que não me avisaram?" Preocupações recentes fizeram seu "botox despencar".
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"Escutar o barulho da máquina de lavar acaba com minha poesia", diz. "Patati Patatá", que uma das gêmeas pediu para ser tema de festa de aniversário, "é a ausência máxima de um verso".
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Ela conta que, no espelho do seu banheiro, escreveu "autoestima". "Sou tão sem estima que posso ganhar o Oscar." A casa está repleta de fotos dela superproduzida.
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Fernanda não participou dos protestos de junho "porque votei certo -não no PT". Acha que "o brasileiro deveria ser punido com quatro anos sem carnaval, para refletir". E elogia SP. "O paulista sabe ser educado com o diferente; no Rio, não, o branco por lá sofre racismo."
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O primeiro semestre também foi marcado pela estreia da série "Surtadas na Yoga", no GNT. Num episódio, a personagem interpretada por ela leva cerveja em uma garrafa de plástico para a aula. Em outro, há uma ereção durante os exercícios. A audiência no horário cresceu 66%.
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Nas redes sociais, as críticas se multiplicaram. "É muito baixo nível, não é engraçado nem inteligente", afirma Anderson Allegro, diretor da escola de yoga Aruna. "Aquilo podia ser no cabeleireiro."
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Fernanda se defende: "Misturamos tudo para fazer piada. Quem se aborrece é bobo". Para Alexandre, que costuma meditar diariamente, "as pessoas sabem que o ser humano pode estar pensando um monte de besteira enquanto entoa o [mantra] 'OM'". A escritora, que se diz seguidora do hinduísmo, afirma que "yoga não foi feita para mim, me dá uma vontade danada de rir. Tenho esse espírito de porco".
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Ela agora prepara para estrear um programa de rádio diário, "Na Fossa com Fernanda", pela Eldorado, "uma espécie de consultório sentimental com muito blues".
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Durante a entrevista com a Folha, ela tomou quatro garrafas de cerveja long neck. Saiu atrasada para uma reunião de condomínio em que discutiria a construção de novas garagens em seu prédio. Chegou ao encontro e disse: "Eu não tenho dinheiro". Os vizinhos ficaram "atônitos", segundo ela. "E eu subi, estava com vontade de fazer xixi! kkkkk", contou um dia depois, numa mensagem enviada pelo celular.