Folha de S. Paulo


Ser professor é aprender diariamente

Ayrton Vignola/Folhapress
Em pesquisa da OCDE, ninguém demonstrou interesse em ser professor
Em pesquisa da OCDE, ninguém demonstrou interesse em ser professor

A matéria "Nenhum jovem quer virar professor no Brasil, mostra exame da OCDE", publicada na Folha, me deixou estarrecida. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico perguntou a brasileiros de 15 anos: O que você quer ser quando tiver 30 anos? Eles responderam: médico (24,8%), engenheiro (20%), advogado (17,9%), profissional de esportes (8,8%), arquiteto (7,5%), artista (4%) etc. Nenhum jovem (0%) respondeu que queria ser professor. Zero por cento!

Desde os meus cinco anos, sempre que me perguntavam: O que você quer ser quando crescer?, respondia sem titubear: "professora".

Sou professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1994. Em maio de 2015 me tornei Professora Titular da UFRJ, um dos momentos mais emocionantes de toda a minha vida. No último semestre, dei três diferentes cursos, para quase 200 alunos de Ciências Sociais e de Psicologia.

É evidente que existem inúmeras dificuldades nesta carreira: os salários são indignos, as condições das escolas são precárias, os métodos de ensino são inadequados para os dias de hoje.

Os professores, mesmo os mais apaixonados e brilhantes, falam do sofrimento que é conviver com a indiferença, o desrespeito e a agressividade de muitos alunos. Reclamam que os alunos faltam, conversam, mexem no celular e até mesmo dormem em suas aulas. "Ninguém reconhece o meu valor e dedicação!", afirmam.

Os alunos reclamam que as aulas são "chatas, pouco interessantes, burocráticas, um verdadeiro tédio". Eles se sentem desrespeitados, ignorados e até mesmo humilhados por alguns professores. "Ninguém me escuta e compreende!"

Apesar de ter que "matar um leão por dia", tenho um enorme orgulho de ser professora. Acho um privilégio ter uma profissão com a qual posso (e preciso) continuar aprendendo diariamente.

Com os meus alunos, aprendi a escutar mais do que falar, observar mais do que opinar e compreender mais do que julgar. Aprendi a ser, como alguns me disseram recentemente, mais atenciosa, mais dedicada e mais "humana".

Iniciei o meu livro "A arte de pesquisar" com uma ideia de Roland Barthes que resume o que sinto, até hoje, cada vez que entro em uma sala de aula: "Nenhum poder, um pouco de saber, um pouco de sabedoria, e o máximo de sabor possível".


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