Folha de S. Paulo


Política vizinha

As empresas brasileiras que atuam na Argentina ou exportam para o vizinho receberam de forma positiva a vitória de Mauricio Macri na eleição presidencial do país.

O recém-eleito, oposicionista de Cristina Kirchner, era o favorito do mercado. De centro-direita, ele faz parte de uma das famílias mais importantes da Argentina, com atividades no setor automobilístico, de alimentação, de construção e de coleta de lixo.

"Macri parece ser de diálogo. Poderá favorecer tanto a integração comercial quanto a produtiva dos dois países", afirma o presidente da Anfavea (associação brasileira das montadoras), Luiz Moan.

"A indústria argentina tinha espaço no governo para reforçar o protecionismo", diz Heitor Klein, da Abicalçados (de calçadistas). "Se a licença para a entrada do produto [no país] era de 60 dias, acabava levando cinco vezes mais."

Alguns executivos, porém, creem que possa haver uma piora no início do mandato.

"Macri terá de fazer ajustes que podem frear a atividade, mas, no médio prazo, tudo deverá melhorar. A tendência é que haja uma abertura do mercado", afirma o presidente do Simers (da indústria de máquinas agrícolas do Rio Grande do Sul), Claudio Bier.

"Caso o peso seja depreciado, as importações argentinas poderão cair no começo", diz Fernando Pimentel, da Abit (setor têxtil). "Mas temos clima para ampliar a relação."

Exportações brasileiras para a argentina* - Por setor, em US$ mi

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Mais próximos

Sócios insatisfeitos do Mercosul, os argentinos devem desarmar barreiras de importação e ficar menos resistentes a demandas dos companheiros de bloco, segundo Ulrich Kuhn, do Sindicato da Indústria Têxtil de Blumenau.

"A Argentina tende a virar um membro mais efetivo do bloco e não atrapalhar a aproximação com os americanos."

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Grupo estuda instalar fábrica de US$ 15 milhões no país

A fabricante de máquinas agrícolas Stara estuda desarquivar o plano de instalação de uma fábrica na Argentina.

A planta, cujo orçamento é de US$ 15 milhões (cerca de R$ 55 milhões), já tinha um terreno definido na província de Córdoba quando seu projeto foi engavetado em 2012.

"Ainda vamos ver como a economia do país vai se movimentar, mas tem possibilidade, sim [de construir a fábrica]", diz o presidente, Gilson Trennepohl.

"Precisamos ver quais serão as garantias para voltar a investir. Hoje, não tenho coragem de colocar um centavo lá, mas já vejo uma luz no fim do túnel", acrescenta.

A companhia parou de comprar e vender ao país vizinho em 2013 por causa das medidas protecionistas. O comércio da empresa com a Argentina, porém, ainda estava em um estágio inicial, com movimentação de US$ 5 milhões por ano.

A Stara deverá faturar R$ 560 milhões em 2015. Pouco mais de 10% desse valor virá das vendas para o mercado externo.

Hoje, a companhia atua com 2.000 funcionários em duas fábricas -ambas no Rio Grande do Sul.

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Ano histórico

A Agrale, fabricante de tratores e caminhões, terá em 2015 seu melhor ano no mercado argentino. Com uma fábrica na província de Buenos Aires, o faturamento no país representará 20% do total.

"Houve uma antecipação das compras lá por causa da entrada, em 2016, do Euro 5 [padrão de veículos menos poluentes, mas mais caros]", diz o presidente, Hugo Zattera.

"As mudanças econômicas teriam de ser feitas por qualquer um dos candidatos. O problema é se elas forem adotadas de supetão, criando dificuldades no mercado."

O grupo, que tem três plantas no Brasil, deverá faturar R$ 900 milhões neste ano.

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Passo adiante

Com a mudança de comando no país vizinho, a gaúcha Bibi Calçados diz acreditar que irá dobrar as vendas para os argentinos.

"O comércio com a Argentina representa cerca de 15% das nossas exportações", diz Marlin Kohlrausch, presidente da empresa. "A tendência é ter menos empecilhos ao diálogo."

"Mas o novo governo herdará uma economia parecida com um paciente na UTI, não é possível resolver todos os entraves comerciais de um dia para o outro."

Também estimulada pelas barreiras aos importados pelos vizinhos, a Bibi se diversificou e hoje mantém negócios com 65 países.

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Lençol maior

As restrições à importação têm impedido que a têxtil Karsten faça mais negócios na Argentina, hoje destino de 25% das exportações da empresa.

"Eles querem comprar mais de nós, mas estão limitados", diz Alvin Rauhl Neto, executivo da companhia. "Com o governo Macri, esperamos alta de 50% nos negócios."

Os vizinhos compõem um destino cobiçado pelo setor têxtil, mas o Brasil perde de 15% a 20% por ano de mercado na Argentina, segundo a Abit (que representa o setor).

"A principal expectativa agora é que haja uma abertura maior por parte do governo de lá para negociar. O que é difícil atualmente [negociar], pode se tornar regra, caso o presidente eleito mantenha o caminho sinalizado."

com LUCIANA DYNIEWICZ, FELIPE GUTIERREZ, DOUGLAS GAVRAS e CLÁUDIO GOLDBERG RABIN


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