Folha de S. Paulo


Em 'Apocalipse', Record aponta o dedo para os 'falsos profetas'

Primeiro com minisséries e depois com novelas inspiradas em narrativas da Bíblia, a Record descobriu uma forma eficiente de divulgar mensagem religiosa embalada por entretenimento de qualidade razoável.

O projeto teve início em 2010, com o lançamento de "A História de Ester", e prosseguiu com "Sansão e Dalila" (2011), "Rei Davi" (2012), "José do Egito" (2013), "Milagres de Jesus" (2014), "Os Dez Mandamentos" (2015-16), "A Terra Prometida" (2016-17) e "O Rico e Lázaro" (2017).

O ápice desta experiência se deu em 10 de novembro de 2015, quando Moises abriu o Mar Vermelho para permitir a fuga dos hebreus do Egito. Naquele dia, a Record festejou média de 28 pontos no Ibope em São Paulo (cada ponto hoje equivale a 199 mil indivíduos), contra 21 pontos da Globo no mesmo horário.

A estreia, há duas semanas, de "Apocalipse" expressa mudança de rota importante. Pela primeira vez, a nova trama bíblica deixa de lado a pretensão de representar histórias descritas em tempos imemoriais e se passa entre 1987 e dias atuais.

Parábolas, metáforas e imagens, usadas nas produções anteriores para transmitir mensagens religiosas, foram deixadas de lado. O enredo e o texto da nova produção são de uma objetividade assustadora.

Uma mensagem na tela na abertura do primeiro capítulo informou: "Baseado em fatos reais do passado, presente e futuro". Uma voz narra a história. É do ator Sérgio Marone e representa o Anticristo: "Chegou a hora de eu aparecer em carne e osso, no foco dos holofotes".

Record TV/Divulgação
Elenco de 'Apocalipse', nova novela da Record
Elenco de 'Apocalipse', nova novela da Record

Sua primeira ação é gerar uma criança que o represente. Em Nova York, Débora, filha de judeus ortodoxos radicados em Jerusalém, conhece Adriano, milionário italiano cuja família é muito próxima de um importante sacerdote católico. Uma nuvem preta surge em cena e envolve os dois. É amor à primeira vista.

Quando os dois começam a namorar no Central Park, o Anticristo explica: "Este é meu pai e a minha mãe. Sempre tive uma coisa pelas morenas, mas há outras razões nos genes de Débora por que eu a escolhi. Mas isso você vai saber mais tarde. Já Adriano vai me proporcionar uma aliança muito estratégica".

A Igreja Católica se chama Sagrada Luz e o sacerdote Stefano Nicolazi (Flávio Galvão), em Roma, é o "falso profeta do Apocalipse". Interessado em dinheiro e poder, é seduzido pelo Anticristo, que aparece para ele como um "anjo de luz".

A fé, ou a falta dela, vai determinar inúmeras situações decisivas ao longo da trama em quatro cidades. No Rio mora Oswaldo, um dos personagens mais importantes. Ele foi um menino problemático, cometeu crimes, foi preso e, cumprindo pena, converteu-se e virou evangélico.

Ao se tornar exemplo de comportamento, impacta a mãe e uma irmã, que também se convertem. Na descrição da sinopse, "Oswaldo simboliza a igreja salva que será levada para junto de Deus no arrebatamento".

Como já ocorreu, o texto é escrito por uma autora profissional, Vivian de Oliveira, mas passa pelo crivo de Cristiane Cardoso. Escritora e apresentadora de um programa sobre relacionamentos amorosos, ela é filha de Edir Macedo, dono da Record e líder da Igreja Universal.

A audiência nas primeiras semanas ficou em torno de 10 pontos, abaixo do esperado. Má notícia para a Record, mas talvez tranquilizadora para quem não vê com bons olhos o esboço de guerra religiosa na TV.


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