Folha de S. Paulo


Série 'The Simpsons' ajuda a entender a eleição de Donald Trump

Uma cena de 60 segundos do 17º episódio da 11ª temporada de "Os Simpsons", exibida em março de 2000, entrou para a história da televisão por conter a "previsão" de que Donald Trump um dia seria presidente dos Estados Unidos.

Na verdade, não é exatamente uma previsão, mas uma piada sinistra, inspirada no noticiário da época. Ao longo de 1999, depois de seu nome ter aparecido em mais de uma pesquisa como candidato com chances em uma eleição presidencial, Trump falou abertamente sobre a possibilidade em entrevistas.

Ainda assim, a cena do episódio, intitulado "Bart to the Future", é exemplar do tipo de humor dos "Simpsons". Ela mostra Lisa Simpson em 2030, recém-empossada como presidente dos Estados Unidos.

Reprodução
Trumptastic Voyage | Season 25 | THE SIMPSONS
Homer Simpson acompanha discurso de Donald Trump em vídeo do seriado "Os Simpsons"

Em sua primeira entrevista, ela fala do orgulho de ser "a primeira mulher heterossexual" a assumir o cargo. Em seguida, a filha mais inteligente de Homer informa à imprensa que a sua administração vai focar em três erres: "reading, writing, and refilling the ocean" (leitura, escrita e reabastecimento do oceano).

Encerrada a entrevista, ela conversa com seus assessores sobre a terrível "herança" deixada pelo "presidente Trump". "Estamos quebrados", informa um deles. A razão: o investimento em um programa para crianças. "Um grande erro."

"Vidente" ou não, a série festejou em 2016 duas grandes consagrações. No início de novembro, poucos dias antes da eleição presidencial, a Fox anunciou ter encomendado mais duas temporadas à equipe de Matt Groening.

Desta forma, ao fim da 30ª temporada, em 2018, "Os Simpsons" vai ostentar o título de a mais longa série americana, com 669 episódios, superando os 635 do western "Gunsmoke", produzido entre 1955 e 1975.

Dois meses antes dessa notícia, em setembro, Groening viu a sua criação ser eleita a melhor série americana de todos os tempos por dois críticos respeitados, Alan Sepinwall e Matt Zoller Seitz.

A escolha aparece no livro "TV (The Book)", no qual os autores elencam as cem melhores produções já realizadas nos Estados Unidos. O Top 10, encabeçado pelos "Simpsons", segue com: 2. "Sopranos"; 3. "The Wire"; 4. "Cheers"; 5. "Breaking Bad"; 6. "Mad Men"; 7. "Seinfeld"; 8. "I Love Lucy"; 9. "Deadwood"; 10. "All in the Family".

É uma boa lista, ainda que, como todas do gênero, sirva mais como ponto de partida para discussão e polêmica do que para concordância. Mais do que o resultado, o esforço de Sepinwall e Seitz interessa por oferecer ferramentas e critérios para este tipo de análise.

Os autores chegaram a essa lista dando, cada um, notas de 1 a 10 a todas as séries, em seis quesitos: inovação, influência, consistência, performance (inclui não só atuação, mas construção dos personagens), "storytelling" (um termo mais abrangente que roteiro) e picos (o quanto a série foi capaz de chegar no seu melhor).

As cinco primeiras séries do Top 10 alcançaram o mesmo resultado: 112 pontos. Eles chegaram à classificação em meio a um longo debate, reproduzido em 20 páginas do livro, no qual admitem, ao final, a subjetividade da escolha.

Em todo caso, qualquer que seja o lugar dos "Simpsons" na sua lista, é preciso reconhecer que poucas séries retrataram tão bem a cultura americana nas últimas décadas. Por esse motivo, e não por causa da tal "previsão", o fã do seriado, com toda certeza, não se surpreendeu com a eleição de Trump.


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