Folha de S. Paulo


Em Nova York, diplomacia brasileira lida com bullying de Trump

Li Muzi/Xinhua
(170919) -- NUEVA YORK, septiembre 19, 2017 (Xinhua) -- El presidente de Brasil, Michel Temer, pronuncia un discurso durante el debate general de la 72 sesión de la Asamblea General de la Organización de las Naciones Unidas (ONU), en la sede de la ONU en Nueva York, Estados Unidos, el 19 de septiembre de 2017. (Xinhua/Li Muzi) (jg) (ce)
Michel Temer discursa na Assembleia Geral da ONU

A Venezuela é uma questão irritante nas relações diplomáticas entre o Brasil e os Estados Unidos há mais de 20 anos. A cada crise em Caracas, Washington pede algum tipo de ação a Brasília. Via de regra, Brasília desconversa e, em consequência, Washington se aborrece e a relação esfria.

Foi isso que ocorreu quando Bill Clinton pediu a FHC uma "atitude firme" face a Hugo Chávez. O tucano tentou convencer Chávez a moderar o tom. Entretanto, insatisfeito, Clinton demandou mais. FHC desabafou com seus colaboradores: "Mas o que ele acha?! Eu não tenho meios para influenciar o Chávez".

A mesma coisa ocorreu no governo do PT. "Vocês precisam fazer alguma coisa em relação à Venezuela", disse George W. Bush. Lula retorquiu com a longa lista de iniciativas que, na perspectiva dele, ajudariam a evitar a radicalização de Caracas.

Sem se convencer, os Estados Unidos insistiram. Lula não aguentou: quebrando o protocolo, telefonou para Bush para reclamar. "Cada vez que vocês falam mal do Chávez, cada vez que vocês pedem à gente para falar mal dele, ele se radicaliza mais".

Nesta semana, viu-se algo similar em Nova York, quando Donald Trump soltou o verbo contra o chavismo. Temer saiu pela tangente: Sanções, disse o presidente, só se forem "verbais". O discurso do presidente brasileiro na ONU —o melhor dos últimos anos— ilustra como a diplomacia brasileira lida com bullies.

Temer esquiva-se da pressão americana porque, como FHC e Lula aprenderam antes dele, moldar o comportamento de Caracas é missão impossível. Além disso, sabe-se que a postura americana, na realidade, é bem mais acomodatícia do que sugere a retórica de Trump.

As palavras exaltadas do presidente americano são um jogo de política interna para aplacar aqueles senadores que obtêm vantagens eleitorais ao espernear contra o chavismo. Nos bastidores, o governo americano já precificou o calote venezuelano que se aproxima, e tomou cuidado para não aplicar sanções contra Tareck El Aissami ou Diosdado Cabello, gente forte do regime venezuelano.

O problema é que a retórica cria sua própria realidade. Se a situação em Caracas piorar, haverá um risco real de fricção entre a Casa Branca e o Planalto, reduzindo o já pequeno espaço de manobra de que o Brasil dispõe para lidar com a Venezuela, seu novo grande problema de segurança nacional.

Soma-se a isso o esfriamento inevitável da relação com os americanos, agora que as malas de Geddel e a evidência que embasa as denúncias de organização criminosa e obstrução da Justiça contra o presidente contaminam todo o ambiente. É uma receita para problemas.


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