Folha de S. Paulo


Diplomacia de Temer para a Venezuela virou pura retórica

Ariana Cubillos-17.jun.2017/Associated Press
An anti-government demonstrator prays while kneeling on a Venezuelan flag as he holds a poster of the Virgin of Fatima, in Caracas, Venezuela, Saturday, June 17, 2017. Hundreds of thousands of demonstrators have taken to the streets demanding new elections as the nation battles triple-digit inflation, crippling food and medical shortages and rising crime.(AP Photo/Ariana Cubillos) ORG XMIT: XAC101
Homem faz protesto contra o governo de Nicolás Maduro em Caracas, na Venezuela

Não importa se você gosta de editoriais antichavistas ou se prefere as notas pró-Maduro do PT. Seja qual for a sua preferência, você achava que Michel Temer trabalharia para se afastar da Venezuela e pressionar o regime em Caracas.

Passado um ano de governo, é hora de pensar de novo.

Temer jogou seu peso para suspender a Venezuela do Mercosul, mas evitou o desgaste de fazê-lo em nome da democracia, apoiando-se, em vez disso, numa pirueta jurídica para punir o país pela não incorporação de normas mercosulinas.

O presidente também aderiu àqueles países que tentaram condenar a ruptura da ordem democrática na Venezuela na Organização dos Estados Americanos (OEA), mas não mobilizou sua rede de embaixadas no Caribe para fazer o corpo a corpo que seria necessário a fim de selar uma vitória.

Temer ainda chamou o embaixador brasileiro em Caracas para "consultas", aparente sinal de distanciamento em relação ao chavismo. Semana passada, porém, mandou-o de volta ao posto, mesmo se tratando de um representante nomeado por Dilma.

Os chanceleres deste governo foram à Rádio Jovem Pan para repetir a tese da "ruptura da ordem democrática", mas nunca contemplaram a possibilidade de acionar o mecanismo que a própria diplomacia brasileira inventou para situações como essa: a declaração presidencial de Potrero de Los Funes, assinada em 1996 e ratificada dois anos depois pelo Protocolo de Ushuaia. Ela permite a Brasília suspender os acordos bilaterais já firmados com Caracas.

Não à toa, embaixadas estrangeiras em Brasília se perguntam quão séria é a retórica antichavista do governo. Indagam se o comportamento brasileiro é produto de falta de interesse ou falta de força, dada a fragilidade política do presidente.

De fato, a prioridade absoluta de Temer é sobreviver junto à base aliada, não lançar grandes empreitadas no exterior. Sua diplomacia precisa ser de baixo custo e risco zero.

No caso da Venezuela, porém, isso é um problema. Por um lado, milhares de famílias venezuelanas chegam a Roraima à procura de ajuda. Por outro, a Venezuela tende a virar um narcoestado, e o contágio por meio de uma fronteira que não controlamos seria inevitável. É nossa pior crise de segurança internacional em décadas.

Não há mais nada que o Planalto possa fazer em Caracas. A janela de oportunidade que antes existia já passou. A única prioridade agora deveria ser a de sensibilizar para valer os três países que ainda sustentam o chavismo e seus desmandos: Cuba, China e Rússia. A julgar pelo andar da carruagem, entretanto, o governo brasileiro não o fará.


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