Folha de S. Paulo


Venezuelanos impõem uma derrota diplomática ao Brasil e aos EUA

Nicholas Kamm/AFP
Manifestantes favoráveis e contrários ao governo Maduro durante protesto em frente à sede da OEA
Manifestantes favoráveis e contrários a Maduro protestam em frente à sede da OEA, nos EUA

Quem subestima a eficácia da diplomacia chavista sempre se dá mal. Se o regime sobrevive há 20 anos é porque, além de conseguir dobrar a oposição interna, aprendeu a resistir às pressões vindas de fora.

Semana passada, os venezuelanos impuseram uma baita derrota diplomática a seus principais inimigos. O cenário foi a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), onde Argentina, Brasil, Estados Unidos e México acreditavam ter os votos necessários para condenar o regime de Caracas. O grupo contabilizara 14 votos certeiros e mais 14 vindos da América Central e do Caribe, uma maioria acachapante.

Na hora, porém, tudo desandou. A diplomacia venezuelana utilizou uma velha tática para ganhar tempo adicional e, em questão de horas, conseguiu afundar o consenso, convencendo oito países do Caribe a rejeitarem a proposta ou a optarem por uma abstenção.

Como é que um regime acuado derrota o conjunto de países mais poderosos do hemisfério?

A diplomacia chavista apostou no corpo a corpo. Sem os recursos petrolíferos de outrora para comprar a adesão de aliados, gastou sola de sapato e gogó. Quem queria condená-la, porém, não fez o mesmo.

Depois de sinalizar que enviariam o secretário de Estado Tillerson para o encontro, os americanos mandaram um representante de terceiro escalão. Por sua vez, o chanceler mexicano, cotado como possível candidato à Presidência de seu país, optou por manter um perfil baixo durante os momentos mais tensos da negociação. A Argentina, onde Macri fez da crítica a Maduro um esteio de sua política interna, idem. E o mesmo ocorreu com o Brasil.

Ilesa, Caracas denunciou os inimigos com a estridência de sempre. Para isso, gozou do apoio de Cuba, detentora de um acervo diplomático inigualável quando se trata de resistir às pressões de países mais poderosos. De quebra, a Venezuela ainda conta com os recursos financeiros que vêm da China e com uma parceria no negócio da compra de armas com a Rússia. É uma combinação contra a qual a retórica antichavista dos Estados Unidos e de tantos países sul-americanos não tem efeito algum.

O grande perdedor dessa história é o Brasil. A crise humanitária que vive a Venezuela piora a cada dia e, junto à força do narcotráfico no coração do chavismo, já representa um problema de segurança nacional na nossa faixa de fronteira.

Em Brasília, as autoridades denunciam que o país vizinho vive uma "ruptura da ordem democrática". Ninguém entende por que, a essa altura, ainda não foi acionada a cláusula por nós próprios concebida para gerir situações dessa natureza.


Endereço da página:

Links no texto: