Folha de S. Paulo


Depois da delação de Mônica Moura, é hora da 'diplomacia do perdão'

Paulo Lisboa/Folhapress
BRASIL,CURITIBA, PR, 01.08.2016 - 16:40h - LAVA JATO - O marqueteiro João Santana e a esposa Mônica Moura,presos na operação lava jato deixam sede da Policia Federal em Curitiba (PR) na tarde desta segunda-feira (01) após decisão do juiz federal Sérgio Moro. (Foto: Paulo Lisboa/Folhapress)
Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana, deixa PF em Curitiba (PR) em agosto de 2016

Mônica Moura delatou a ingerência do governo do PT em processos eleitorais em Angola, El Salvador e Venezuela. Junto à evidência já apresentada por Marcelo Odebrecht de pagamento de propinas na ordem de US$ 400 milhões em uma dúzia de países estrangeiros, as revelações expõem entranhas até agora desconhecidas das relações exteriores do Brasil.

O escândalo é nefasto, e seu impacto tem alcance além das empreiteiras envolvidas, das operações internacionais do BNDES e da imagem global do PT. Afeta a própria diplomacia do país, que passou décadas a fio construindo boa reputação.

O que fazer?

A prioridade absoluta é reconhecer a existência do problema. Não é o que fez o governo nesta semana: em visita à África do Sul, o chanceler Aloysio Nunes chegou a festejar a suposta identidade do Brasil com a África do Sul de Jacob Zuma, um regime sabidamente cleptocrata.

Para reverter o problema, seria útil praticar a "diplomacia do perdão": o procedimento diplomático pelo qual um governo reconhece equívocos passados como forma de virar a página e seguir em direção a um futuro melhor.

Os casos mais extremos são o pedido de perdão dos alemães pelo Holocausto e dos japoneses pelos crimes da Segunda Guerra. Bill Clinton desculpou-se pela inação americana em Ruanda, e Carlos Menem, pela guerra das Malvinas.

A ingerência em assuntos internos de terceiros países por meio de dinheiro muitas vezes obtido em licitações viciadas ou fraudulentas não se compara a terríveis crimes contra a humanidade. Mas é um espanto que mancha o valioso acervo diplomático do Brasil. E, por isso, o futuro presidente deverá fazer um gesto público de compunção.

Muita gente tentará demovê-lo da ideia. Uns dirão ser uma admissão de fraqueza. Outros alertarão para o risco de eventuais pedidos de reparação. Os mais cínicos dirão que todo país grande pratica corrupção no estrangeiro e melhor seria dar tempo ao tempo, esperando a onda baixar.

O futuro presidente deverá ignorar essa gente e fazer o que mais serve os interesses da sociedade brasileira. Quem pede desculpas pelos erros cometidos revela força, não fraqueza. Um pedido internacional de desculpas é, por si só, fonte de reparação. E esse seria o melhor cartão de visitas do novo sistema de compliance do BNDES.

Restaurar o prestígio internacional do Brasil (e de suas multinacionais) é uma tarefa difícil e de longo prazo, especialmente na América do Sul e na África, dois pilares básicos de nossa presença internacional.

Deveríamos investir nisso, limpando de uma vez por todas a mancha de país exportador de sujeira.


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