Folha de S. Paulo


Crise na Venezuela pede nova coalizão internacional

Marco Bello/Reuters
Policiais e manifestantes entram em confronto durante protesto contra o governo do presidente Nicolás Maduro, em Caracas, Venezuela
Policiais e manifestantes entram em confronto durante protesto contra o governo da Venezuela

Nenhuma proposta internacional para impedir o colapso da Venezuela funcionou —Estados Unidos, Vaticano, Unasul e OEA já tentaram.

A julgar pela temperatura nas ruas de Caracas, é plausível esperar uma escalada nova da violência. Isso porque o presidente Nicolás Maduro e seu grupo não podem recuar: se o fizessem, enfrentariam uma caça às bruxas. Sua única estratégia viável de sobrevivência é mais intransigência, repressão e concentração de poder.

Ocorre que isso depende do apoio do Exército, da polícia e da Guarda Nacional, grupos cada vez mais insatisfeitos com o chavismo. Afinal, eles apoiam o regime porque, em troca, recebem renda e propinas oriundas da indústria do petróleo, do tráfico de drogas e da distribuição de remédios e comida. Manter a defesa em pé, porém, está ficando cada vez mais complicado.

Quem controla as armas está repensando seu futuro. Antes de ir à rua para defender Maduro, os homens de farda preferem garantir um papel para si num eventual processo de transição. Para isso, eles têm de preservar algum apoio social. Quanto mais violento Maduro ficar, mais incentivo os militares terão para abandoná-lo.

Chegou a hora de a comunidade internacional aproveitar essa conjuntura e ajudar a Venezuela a sair do ciclo de destruição em que se encontra. Para atingir esse objetivo, a América Latina deveria testar uma fórmula própria, como já o fez há 30 anos, no processo de Contadora, na América Central.

Trata-se da criação de um "Grupo de Apoio à Venezuela", composto pelos presidentes de Argentina, Brasil, Colômbia, Peru e México, além do secretário-geral da ONU. Criado para lidar com a emergência, o grupo apresentaria quatro demandas às autoridades venezuelanas: aceitação, por parte de Caracas, de ajuda internacional humanitária (remédios e comida), a marcação de um calendário eleitoral, a libertação de todos os presos políticos e a garantia do direito da população ao protesto.

O grupo desistiria de tentar fazer o chavismo conversar com a oposição. Tampouco imporia uma agenda de justiça em resposta aos crimes cometidos. E tentaria trazer Cuba para o grupo, nem que seja num segundo momento.

O grupo de apoio ainda estabeleceria um canal de comunicação com Vladimir Padrino, principal liderança militar do país. E sinalizaria a Maduro com a possibilidade de asilo. O objetivo é criar condições externas favoráveis para a transição que apenas os venezuelanos podem comandar.

O governo Temer não vai liderar essa empreitada. Mas Brasília seguirá a reboque os presidentes latino-americanos que, cientes de sua responsabilidade coletiva, decidirem arregaçar as mangas e fazê-lo.


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