Folha de S. Paulo


Com Trump, México não fará realinhamento em direção ao Brasil

Yuri Cortez - 31.ago.2016/AFP
O candidato republicano à Casa Branca, Donald Trump, se encontra com o presidente mexicanos Enrique Peña Nieto, na Cidade do México
Trump, ainda candidato à Casa Branca, em visita ao presidente mexicano, Enrique Peña Nieto

Ganha força na imprensa brasileira a tese segundo a qual as tensões entre Donald Trump e o México criariam uma boa oportunidade para o Brasil. Segundo esse raciocínio, a diplomacia mexicana teria um incentivo para buscar maior convergência com Brasília.

Essa interpretação tem a vantagem de vislumbrar no futuro uma forma de transcender o passado. Brasil e México sempre perderam chances de montar uma aliança. O caso mais dramático ocorreu há 35 anos, quando os dois países deixaram de montar uma coalizão para enfrentar a crise da dívida externa. A nova expectativa de convergência, no entanto, baseia-se em um diagnóstico equivocado.

Trump vai renegociar os termos de seu comércio com o México por meio do unilateralismo agressivo que é sua marca distintiva. No caminho, o presidente agradará a base eleitoral que enxerga a imigração mexicana como problema.

Só que o México não responderá a essas pressões por meio de parcerias alternativas. O país já possui acordos de livre comércio com 43 países diferentes, mas nenhum deles é substituto para os Estados Unidos. A interdependência mexicano-americana é uma força estrutural irreversível.

A estratégia do México será tentar normalizar as relações com Trump. Por isso, seus diplomatas já repetem que a fronteira tem trechos murados há tempos, e que a renegociação do Nafta poderá trazer um bom ajuste para os interesses mexicanos.

Essa estratégia não é de fuga em direção a novos parceiros, mas de redução de danos diante de um vizinho do qual não se pode escapar. Em que pesem as diferenças de tom e linguagem corporal, essa lógica valerá para governos mexicanos de direita e de esquerda.

Nesse sentido, hoje, o maior aliado do México são os equívocos do próprio Trump. Por exemplo, ao abandonar Parceria Transpacífico, o grande acordo comercial proposto por Obama, os americanos perderam um fabuloso instrumento de pressão contra os mexicanos.

É fantasia acreditar que o Brasil possa ser uma alternativa geopolítica de peso para o México. No ranking global de ambiente de negócios, os mexicanos estão na posição 47, o Brasil na 123. Em grau de abertura econômica, 54 contra 70. Em competitividade global, 51 contra 81. A complementaridade entre as economias brasileira e mexicana é baixa, não alta. Quando o tema é política internacional, os interesses e valores das diplomacias brasileira e mexicana nunca são muito coincidentes.

Nada disso significa que o Brasil não deva buscar mais intercâmbio com o México. A relação tem tudo para crescer muito, dada sua atual modéstia. Mas imaginar um realinhamento estratégico graças à chegada de Trump é quimera.


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