Folha de S. Paulo


Crise na Coreia do Norte reativa a importância da embaixada do Brasil

KCNA/Reuters
O ditador norte-coreano, Kim Jong-un

Do teste de mísseis e de armas nucleares ao assassinato de inimigos, a Coreia do Norte tem tudo para virar o lugar mais volátil do mundo. O jogo é perigoso porque qualquer escalada envolverá as principais potências da Ásia —China, Japão, Rússia e Estados Unidos.

As implicações para o Brasil vão muito além de uma eventual conflagração. Afinal, somos um dos poucos países do mundo com embaixada naquele país.

Foi de FHC a decisão de abrir a embaixada em Pyongyang, numa época em que o regime norte-coreano dava sinais de distensão.

Como demoramos para efetivar a abertura, entretanto, o posto só foi criado quando o contexto geopolítico havia mudado para pior.

Coube a Lula inaugurar a embaixada em 2009, sob críticas pesadas da oposição tucana. O governo do PT defendeu sua postura assim: se o regime norte-coreano é um dos mais isolados do planeta, o Brasil contribuirá para a paz e para a estabilidade se tiver um posto de observação capaz de oferecer uma perspectiva diferente daquela da imprensa ocidental e dos governos hostis a Pyongyang.

O argumento não era louco. De fato, a comunidade internacional é mal-informada sobre a situação real do país. A imagem de um povo fanático que se submete voluntariamente aos desmandos de um regime desvairado é mais uma caricatura que empobrece o debate informado sobre política internacional.

No entanto, a capacidade brasileira de traduzir a situação real para o resto da comunidade internacional sempre enfrentou problemas. Quando o primeiro embaixador do Brasil assumiu o posto, foi obrigado a entregar o aparelho celular no aeroporto. A embaixada foi proibida de usar criptografia para resguardar o sigilo de seus telegramas, e as informações do governo sempre foram concedidas a conta-gotas.

Com Dilma, a postura brasileira foi esdrúxula. Quando o regime realizou um teste nuclear, o governo brasileiro deixou de receber o embaixador norte-coreano no Itamaraty. Brasília ainda suspendeu o envio de feijão e deixou Pyongyang sem embaixador. Em vez de servir como ponte entre a Coreia do Norte e o mundo, o Brasil adotou gestos punitivos, contradizendo a decisão original de criar um canal supostamente isento naquela capital.

Os coreanos não revidaram. Pelo contrário, redobraram a aposta em diálogo. Trataram o encarregado de negócios brasileiro como se embaixador fosse e, quando Temer assumiu, mandaram um representante novo para Brasília. O diplomata já esteve com o ministro da Cultura e fez visitas a governos estaduais. Anteontem, foi ao Itamaraty.

A situação coreana tende a piorar. Desta vez, é bom o Brasil se preparar.


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