Folha de S. Paulo


Má reputação no quesito corrupção atrapalha relações exteriores do Brasil

Paulo Lisboa3.fev.2016/Brazil Photo Press/Folhapress
Marcelo Odebrecht, preso na Operação Lava Jato, chega à sede da Justiça Federal, em Curitiba (PR), onde presta depoimento nesta sexta
Marcelo Odebrecht, preso na Lava Jato, chega à sede da Justiça Federal em Curitiba para depoimento

As piores mazelas nacionais sempre atrapalharam a condução dos negócios estrangeiros do Brasil.

Da escravidão no Império ao pau-de-arara na ditadura militar, a sociedade pagou os custos internacionais de ter a classe política que tem. Sanções impostas por terceiros países, punições e isolamento foram recorrentes em nossa história.

O grosso da classe política sempre reagiu na defensiva. Não à toa, a diplomacia tornou-se bem eficaz em montar escudos jurídicos ou coalizões para resistir a pressões estrangeiras.

Nada disso mudou com a democracia. Do acidente radiológico em Goiânia ao massacre do Carandiru, quando os custos de reputação no exterior ficaram altos, a classe política respondeu na retranca.

Um exemplo tragicômico ocorreu na semana da chacina da Candelária, com o assassinato de crianças no Rio de Janeiro. Como as manchetes dos principais jornais do mundo passaram dias dedicadas ao assunto, Itamar Franco ordenou a seus embaixadores uma ofensiva contra a imprensa internacional. Diante da missão impossível, o presidente ameaçou seus funcionários com demissão generalizada. Melhor seria se tivesse investido o tempo buscando uma solução para os esquadrões de extermínio, tão comuns à época.

O problema é que o Brasil depende de boa reputação para tocar sua agenda externa, pois não possui nem vai adquirir os elementos para se fazer ouvir à força ou pela imposição. A atitude defensiva, em vez de mitigar a situação, piora.

Em 2017, a mazela da hora é a corrupção. O problema se arrasta há pelo menos dez anos, quando estourou o mensalão. Só que agora tudo piorou, pois governantes de países vizinhos correm risco real de terminar no xilindró por causa do esquemão de internacionalização das grandes empreiteiras brasileiras com crédito subsidiado por toda a sociedade. O impacto reputacional disso tudo é gigantesco.

Limpar a sujeira demandará anos de trabalho diplomático cuidadoso. O que significa isso na prática? Pedir desculpas às sociedades dos países envolvidos. Estabelecer regras anticorrupção claras para empréstimos internacionais do BNDES e um código de conduta formalizado para os órgãos de governo que se dedicam à promoção de serviços brasileiros no estrangeiro. Fazer da diplomacia presidencial um instrumento para reerguer as empreiteiras brasileiras, o dia que as mesmas, reestruturadas depois da Lava Jato, puderem ser apresentadas ao mundo.

É algo que o governo atual não fará. A imagem tragicômica destes últimos dias foi a tertúlia entre o próximo ministro do Supremo e seus réus. O vácuo, portanto, continua aí. Um dia, será necessário reverter nossa má reputação no exterior. Caberá a algum futuro líder assumir a dianteira.


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