Folha de S. Paulo


Na fronteira

Um tiroteio na fronteira entre a Venezuela e a Colômbia acendeu o pavio da mais recente crise internacional de nossa vizinhança.

De olho nas eleições de dezembro, Nicolás Maduro esticou a corda. Denunciou os cidadãos colombianos como fonte de criminalidade e contrabando, expulsando mil deles do país. Outros 5.000 saíram com medo. Se a situação piorar, há risco de uma grave crise humanitária.

O problema é artificial e, como todos sabem, manter a fronteira fechada é insustentável porque aquela é uma área de enorme dinamismo econômico. Além disso, 4 milhões de colombianos vivem na Venezuela, gerando um caldo de insatisfação difícil de controlar. Até dezembro, porém, Maduro não tem incentivo algum para reverter as coisas. Sua aposta é arriscada porque uma escalada de violência nunca é fácil de conter.

Se errar na mão, pode reprisar o filme de Galtieri, o general argentino que se lançou à conquista das Malvinas.

Nessas circunstâncias, o governo colombiano assiste à crise de mãos atadas. O presidente Juan Manuel Santos investiu muito na aproximação com a Venezuela e, agora, uma reversão poderia feri-lo nas eleições que enfrentará no próximo dia 25 de outubro.

Santos ainda padece de falta de apoio externo.

Anteontem, ele não conseguiu obter o apoio da OEA e, ontem, ficou claro que a Unasul tampouco virá a seu resgate de modo decisivo.

Para Santos, a opção factível é empurrar com a barriga até dezembro, pedindo aos céus para que a violência contra cidadãos colombianos não chegue ao ponto de forçá-lo a reagir.

Qual o papel do Brasil nessa história?

No Planalto, ninguém esconde exasperação com a diplomacia venezuelana. Os adjetivos utilizados para caracterizá-la não cabem nas páginas deste jornal, que é lido por toda a família. No entanto, ninguém em Brasília está disposto a entrar na briga. Ouve-se que fazê-lo poderia deteriorar o relacionamento com Caracas às vésperas de uma difícil eleição e até mesmo insuflar Maduro ainda mais.

Isso dito, há medidas específicas que o governo brasileiro pode tomar em repúdio sutil à patacoada venezuelana. O cenário ideal para tanto é a visita oficial de Dilma à Colômbia, em 5 de outubro próximo.

A presidente pode pousar em Bogotá com dois acordos hoje emperrados do lado brasileiro –um sobre comércio fronteiriço e outro sobre direito de residência.

Ela ainda pode assinar um ambicioso instrumento de facilitação de investimentos, que está quase pronto.

Acima de tudo, pode chegar bem preparada para responder às perguntas inconvenientes que lhe farão sobre o espinhoso aliado venezuelano.


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