Folha de S. Paulo


Quem é a vítima?

A cobertura jornalística do chamado Collorgate suscita reações cada vez mais incisivas dos leitores que entram em contato comigo. Desde o dia 1° de julho até sexta-feira passada, dia 10, houve 19 manifestações por telefone, fax ou carta. Dessas, três foram favoráveis à cobertura da Folha. As outras 16 foram contra. Nesse cômputo, não estão consideradas as opiniões das pessoas anônimas - nem sempre educadas - na secretária eletrônica.

Dos leitores insatisfeitos, que aparecem em maioria nesse levantamento também porque o ombudsman tende a galvanizar o protesto, uma boa parte declara-se exausta (já em 23 cartas enviadas ao Painel do Leitor até sexta-feira houve uma maioria favorável ao editorial de capa "Renúncia já" numa proporção de 16 a 7).

Em telefonema a mim, o advogado Aparecido do Amaral, de São Paulo, reclama da extensão da cobertura e lembra que existem assuntos esquecidos, "que ficam no meio do caminho". O engenheiro Sérgio Prado, também da capital paulista, perguntou se não há "outras maracutaias" acontecendo no país".

O médico Mauro Leite, de Belo Horizonte, ameaça cancelar sua assinatura. Diz que "há quase um mês a Folha vem dedicando um caderno inteiro" para o Collorgate e se espanta com o fato de o jornal "usar tanto espaço para dizer tão pouco".

Há os que, como a psicopedagoga Regina Leite, associam suas críticas a reprovações ao editorial "Renúncia já", publicado na capa da Folha. Leite afirma que o jornal "está botando mais lenha na fogueira" e que "não está torcendo para o Brasil dar certo, mas sim para o presidente Collor dar errado".

Existe quem vá ainda mais longe, como o assessor de Recursos Humanos Ernani de Paiva Junior, de Campinas, o qual aposta "interesses revanchistas na campanha contra o presidente Collor". Recorda-se do episódio da invasão do jornal por agentes da Polícia Federal, o que teria tornado a Folha uma espécie de inimiga de morte do presidente Collor.

José Orlando Veras, de Presidente Prudente, acusa o que julga ser uma desproporção muito grande entre o que a Folha tem publicado em termos de notícias acusando o governo e a "necessária apresentação de provas para embasar essas denúncias". Veras critica o fato de que nas 12 páginas dedicadas ao assunto na edição de quinta-feira passada havia apenas duas que poderiam ser consideradas favoráveis ao governo, ambas publicadas sem destaque.

Por último, reaparece uma antiga crítica, já verberada em campanhas eleitorais. O comerciante Rubens Satsteban, de São Paulo, atribui o tom da cobertura ao fato de que o jornal estaria "muito petista".

Dentre os que apoiam a Folha estão os que torcem para a queda de Collor e clamam pelo "tiro derradeiro", como Atanásio Mykonios, de Mogi das Cruzes, em São Paulo, ou os que parabenizam este jornal "por estar mais uma vez ao lado dos anseios democráticos da população", como expressou o secretário-geral do PT de Minas, Marcus Flora, em nome do partido daquele Estado.

Vale observar que em determinada medida as investigações acerca do governo Collor, se prestam um serviço ao país, ao trazer para conhecimento geral o mecanismo pelo qual candidatos, autoridades e empresas privadas se apropriam do dinheiro do contribuinte, justamente por isso geram uma reação contrária, uma rejeição, uma espécie de aversão a que os jornalistas continuem revirando e exibindo a imundície. O presidente tentou tirar partido deste sentimento ao referir-se, na última sexta-feira, a seus inimigos como "porcos". Há quem diga que aquilo que você não sabe não vai incomodá-lo.

Consciente, a administração Collor trabalha em toda oportunidade para mudar a maré, assumir o papel de vítima de uma campanha, como Nixon tentou durante o caso Watergate. Até agora, o presidente não conseguiu, como indica pesquisa de opinião recente do DataFolha.

Mas a insatisfação e o cansaço dos leitores mostram que o presidente ainda tem chances, sobretudo se tiver a impressão de que o noticiário não é equilibrado no conteúdo nem racionalmente adequado em suas dimensões. Enfim, as opiniões continuarão aparecendo, pois o Collorgate ao que tudo indica está muito longe do final, ainda que muitos, por uma ou outra razão, o desejem com ardor.

ALTA E BAIXA

ALTA para a Folha, pela revelação da associação entre Collor e PC Farias para a compra de terreno vizinho à casa da Dinda, o que desmente alegações do presidente Collor de que não mantinha relações com o ex-tesoureiro de sua campanha há dois anos.

ALTA para "O Globo" pela revelação de que os telefones da residência do ex-secretário particular do presidente Collor, Cláudio Vieira, estão em nome de uma empresa de PC Farias.

BAIXA para "O Estado", por sua cobertura sofrível - a pior dos quatro jornais de repercussão nacional - dos acontecimentos em torno da CPI do PC

ALTA para o jornal carioca "O Dia", o segundo em vendas no Rio, por sua recente modernização gráfica, com uso interno de cores.

BAIXA para todos aqueles da imprensa que começam a recuar diante das enormes pressões do governo.


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