Folha de S. Paulo


A demissão do ombudsman

No que está sendo considerada a maior agressão à liberdade de expressão nos últimos tempos no país e que alcança repercussão internacional, o ombudsman do Jornal Winnipeg Free-Press", da cidade de Winnipeg, no centro-sul do Canadá, foi demitido de seu cargo no dia l de maio.

Após quatro anos e meio na função, Barry Mullin, 50, foi dispensado pelo recém-nomeado publisher Maurice Switzer por causa de uma coluna em que o defensor dos leitores criticava o "Free-Press" por não ter noticiado na primeira página da edição de 30 de abril os distúrbios que atingiram Los Angeles no dia anterior.

Em sua coluna, publicada na edição de sexta-feira, Mullin dizia: "Foi péssima a falha temporária de ontem para reconhecer como notícia mais importante a erupção de violência em Los Angeles que se seguiu à absolvição de quatro policiais brancos julgados pejo espancamento de um negro numa sequência que foi gravada e exibida à exaustão.

De 30 mil a 35 mil exemplares do "Free-Press" (que tem uma circulação de 175 mil nos dias de semana) foram distribuídos sem que a primeira página sequer registrasse o fato. Nesses o destaque fora para uma "boa notícia" com fotos coloridas, enfocando dois jovens heróis distinguidos por prestarem serviços à comunidade de Winnipeg. A rebelião de Los Angeles aparecia apenas na manchete da página D-6.

Leitores que receberam o jornal sem a notícia na capa mas que já sabiam da revolta pela TV desde a noite anterior reclamaram exatamente como os leitores da Folha em situações semelhantes. Um chegou a dizer que o Jornal agia assim por não ter concorrente.

O ombudsman canadense analisou o fato dizendo que, desde que o jornal sofreu uma "cirurgia plástica" no segundo semestre de 1991, um crescente número de leitores tem percebido que o "Free Press" começou a mudar seu foco de atenção, privilegiando notícias mais leves e positivas em lugar das mais críticas e céticas.

Mullin concluía o que veio a ser seu último artigo - o qual, diz ele, não era mais nem menos crítico que os outros - dizendo que menosprezar uma história como a de Los Angeles mesmo em 30 mil exemplares da edição não contribuía para aumentar a credibilidade do jornal junto aos leitores.

No dia da publicação da coluna, o ombudsman foi chamado à sala do publisher, que o chamou de irresponsável e insubordinado. O chefe lhe comunicou que a partir daquele dia deixaria de ser independente, tendo que submeter o conteúdo de suas colunas a prévia aprovação da direção e com 48 horas de antecedência. Mais: o ombudsman teria que se retratar do que dissera sobre o jornal e desculpar-se publicamente pela coluna.

Mullin não aceitou e, apesar de seu contrato de estabilidade, foi demitido. O caso se encontra agora na Justiça. Os leitores do Jornal até hoje não tiveram uma satisfação a respeito.

Na sexta-feira, Mullin declarou a essa coluna sua convicção de que a liberdade de opinião e a total independência do ombudsman são entidades supremas para que pudesse exercer seu papel. Sem elas não havia condições para a função. Disse ainda: "Os leitores têm que ser informados da verdade, dos eventos que realmente transformam o mundo à sua volta, por mais desagradáveis que sejam".

Em defesa do direito do leitor à informação, Mullin denunciou o pacto da ignorância que crescia no seu jornal, e não só nele. Dessa vez, no Canadá, o país mais desenvolvido em termos sociais no planeta, a ignorância venceu.

A DEMISSÃO DA REPÓRTER

A demissão da repórter da Folha Rosana Bond pela publicação de reportagem com informação incorreta (o suposto indiciamento do general Agenor Homem de Carvalho, chefe do Gabinete Militar da Presidência, do coronel Roberto Pimenta, assessor de Agenor, e da construtora Norberto Odebrecht) provocou quatro manifestações de leitores ao ombudsman.

Todas foram em solidariedade à repórter. A reportagem com as informações incorretas foi publicada na manchete de capa do jornal. O "Erramos" também saiu no alto da Primeira Página no dia seguinte, sábado, dia 16 de maio. O texto do "Erramos" argumentava em nome do interesse do leitor, para justificar a demissão.

Nota da Redação publicada na sexta-feira passada em resposta a cartas de leitores alinhava, entre outros argumentos, o de que a repórter fora consultada três vezes, antes da publicação da reportagem errada. Nas três oportunidades ela teria dito que estava segura a respeito do indiciamento.

Até aí nada a opor. Medidas tinham mesmo que ser tomadas. Mas só contra ela? Não houve outras responsabilidades? E seus superiores? Não deveriam certificar-se, checar a correção da informação? Estranho que a manchete do jornal do dia ("PF pede a Supremo o indiciamento de Magri por suborno") não tenha incluído a informação mais surpreendente e explosiva, e que constou apenas do texto abaixo da manchete, a respeito do suposto indiciamento do general Agenor. Estariam os editora do jornal inseguros da importante informação, a ponto de não a colocarem na manchete, mas ainda assim a publicaram?

A dureza expressa pela demissão deveria propiciar uma revisão profunda dos critérios pelos quais uma informação é considerada confirmada o suficiente não só para ser publicada como para entrar na Primeira Página da Folha.

ALTA E BAIXA

ALTA para o "Jornal da Tarde", pela publicação de carta enviada em 1990 de Pedro Collor a seu irmão Fernando Collor de Mello em resposta a uma série de acusações de cobrança de propinas e rápido enriquecimento pessoal às custas do patrimônio da família em Alagoas.

BAIXA para a Folha, pela fraqueza de sua cobertura da briga na família Collor.

BAIXA para a Folha, por classificar como "terrorista", o militante da ALN, Manuel Urbano Villela. A terminologia usada no título "Dossiê do extinto Dops revela que Zé Celso foi preso em 1974 por abrigar terrorista da ALN" apenas repete a propaganda usada pelos órgãos de repressão do regime autoritário. Em relação à palavra o "Novo Manual de Redação da Folha" recomenda: "Use apenas em sentido técnico, evitando a carga ideológica positiva ou negativa atribuída seja pela esquerda seja pela direita".

RETRANCA

A leitora Danuza Leão escreve: "Como assinante da Folha, e morando no Rio, preferiria receber, na edição de domingo, a nova revista do jornal do que o caderno de imóveis. Não dá para trocar?". Danuza sugere ainda que o jornal faça reportagem sobre reforma tributária/ajuste fiscal em termos simples. Ela quer saber em que sua vida vai mudar com as reformas: "Que as.... do governo vão melhorar já sei, mas não é nisso que estou interessada".


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