Folha de S. Paulo


Até quando?

É sempre cômodo para quem escreve abrir texto exibindo certo "bom senso" fácil destinado a receber apoio imediato. Apesar de ser de bom tom evitar o estratagema, o caso demanda mesmo intervenção óbvia e, ao que tudo indica, de ampla aceitação: é preciso dizer que a atual briga entre Folha e "O Estado" foi longe demais, encheu as medidas, extrapolou os limites do razoável.

Se as pessoas mais envolvidas nas escaramuças, as que dirigem os dois jornais, afastarem a fumaça do tiroteio e observarem a cena com isenção, se olharem para a platéia, concordarão: o destaque dado ao assunto fere os ouvidos como um ruído desagradável a que o leitor se vê compulsoriamente exposto.

O espaço gasto na briga é desproporcional, não tem a menor correspondência com a relevância do assunto. Informações importantes deixam de ser publicadas. O fenômeno coincide com tempos de jornais minguados, submetidos a severos esquemas de racionamento "de papel".

A empreitada implica grandes gastos. A se julgar pelas tabelas de preços, uma página de publicidade da Folha ou em "O Estado" dificilmente custa menos do que Cr$ 70 milhões ou Cr$ 80 milhões. Nos domingos elas podem ultrapassar os Cr$ 100 milhões; é um espaço caro, o que é dedicado para a briga dos jornais. E as páginas gastas com o assunto já se contam às dezenas.

O maior prejuízo, entretanto, não é financeiro, é de imagem. "O Estado" gasta pelo menos uma página por dia para dizer a seus leitores aquilo que já disse no dia anterior, que por sua vez repetia a véspera: o roteiro de ofertas de empregos e imóveis publicado pela Folha aos domingos constitui concorrência desleal. Diz também que o roteiro traz informações forjadas e anúncios por empresas enganadoras, arapucas.

A Folha gasta outra página em média por dia para retrucar. Diz também que o concorrente pública anúncios de arapucas, que edita jornais de anúncios grátis. Acusa "O Estado" de bajular o ex-ministro das Comunicação Antonio Carlos Magalhães porque dele teria conseguido a concessão para a exploração de listas telefônicas. Denuncia o cartel formado entre "O Estado" e as agências atravessadoras de anúncios de empregos.

A campanha é tão repetitiva e parcial que se torna inócua. É verdade que existem assuntos sérios a ela associados -como a dependência de muitos veículos de comunicação em relação ao governo, mas até a credibilidade de tais notícias se vê posta em xeque no quebra-pau geral. Tudo exala um ar de noticiário duvidoso, interessado.

O problema assume contornos ainda mais graves para os leitores de "O Estado", que não tem um ombudsman para veicular análise independente das notícias publicadas pelo jornal.

Mais constrangedor é perceber que no episódio os dois jornais deixaram transparecer uma subestimação da inteligência dos leitores. Estes são tomados como entes primários a ponto de acreditar que em clima de hostilidade aberta, as notícias de um a respeito do outro possam ser isentas, equânimes e confiáveis.

O que se está fazendo é uma enfadonha guerra de desgaste para debilitar a imagem do concorrente. Já se disse que na guerra a verdade é a primeira linha de tiro, a afirmação parece ainda mais válida quando são os próprios jornais que vão a campo em combate.

Os jornais faziam bem se poupassem as leitoras desse fogo de barragem e se deixassem a solução de suas divergências aos advogados de ambos. Os leitores e os próprios jornais ganhariam muito com isso.

ALTA E BAIXA

BAIXA para "O Estado" e o "Jornal do Brasil", por terem deixado de noticiar, na edição de quinta-feira passada, a notícia do suposto suborno envolvendo o ex-ministro Antonio Rogério Magro, Folha e "O Globo" saíram na frente.

BAIXA para a TV Globo, por adotar novas restrições em seu horário sobre o governador do Rio, Leonel Brizola. A Globo não está fazendo um 92 diferente.

ALTA para a Folha, pela qualidade de seu guia de Fórmula 1, que circulou na segunda-feira passada, dia 24. Quando quer, o jornal consegue fazer jornalismo inovador.


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