Folha de S. Paulo


Lições de jornalismo chapa branca

É sabida a aversão que empolga muitos jornalistas e suas publicações diante de quem se aventura a criticá-los de tempos em tempos, eles se dispõem gravemente a um acerto de contas com quem ousou vir à luz para duvidar de seus propósitos.

Desde que o país retornou à democracia, a sociedade exerce prerrogativas inesgotáveis de crítica. Critica-se antes de tudo o governo federal. Uns saem impetuosamente na frente, outros, de índole mais cautelosa, esperam para ver de que lado sopra o vento para só então adensar o coro da malhação nacional. Mas sobra espinafração também para os partidos políticos, os economistas, os empresários, suas empresas, os artistas, os técnicos de futebol. Quem lidera esse vaivém, esse permanente acerto de contas de todos contra todos é a imprensa.

Os interesses desta passam, porém, muitas vezes inexplicavelmente incógnitos. Ao falar de seu ofício, a atitude comum a muitos expoentes da imprensa é bater no peito, se ufanar do vasto poder e influencia que tem sobre a opinião pública, de sua inquebrantável resistência frente a qualquer convite para que sua publicação se venda a quem quer que seja.

É pelo fato de deterem tanto poder sobre as ideias e as informações a que o público tem acesso, que a sociedade deve esperar que os meios de comunicação mantenham suas ligações e preferências inteiramente transparentes. Em princípio não há nada de errado que uma revista, por exemplo, estabeleça vínculos de natureza privilegiada com uma candidatura ou um partido. Mas é melhor para a sociedade que essa vinculação seja aberta, pública. Do lado da publicação, a inteligência recomendaria que assim fosse, mesmo porque esses laços ocultos acabam vindo à tona. Fingir que eles não existem termina sendo pior para a imagem da publicação do que assumir sua realidade.

Esta coluna, que em geral se detém sobre aquilo que é publicado na imprensa, estranhou no dia 22 de dezembro passado o fato de "IstoÉ Senhor" jogar na cesta de lixo informações de evidente interesse geral. A revista não divulga fatos desfavoráveis ao esquema Quércia-Fleury. Alvoroçada pelas constatações, que de resto não constituem -novidade para qualquer ser pensante minimamente observador- "IstoÉ Senhor" dedicou um editorial ao assunto.

Naquele estilo pregueado, a peça-resposta descreve circunvoluções sobre a vaidade dos jornalistas, as semelhanças entre o ombudsman e o papa, seu estilo de lenhador. Entretanto, ao final da leitura fica a sensação de que a revista apenas faz de conta que responde ao ataque. Como restaram intocadas as questões mais esclarecedoras eles vão aqui formuladas mais uma vez, de maneira mais explícita: Quais são afinal os compromissos entre "IstoÉ Senhor" e o governo de São Paulo, os quais levaram a publicação a não noticiar as acusações de irregularidade envolvendo o presidente da Sabesp no governo Fleury, o mesmo que foi presidente da Eletropaulo no governo Quércia? Têm essas relações algo a ver com o fato de o Banespa ter destinado o ano passado US$ 1,8 milhão para financiar encartes especiais na revista?
Também o Banespa poderia esclarecer a razão pela qual vem destinado US$ 3 milhões para patrocinar a publicação de uma outra série de encartes na mesma revista dedicados ao tema dos 110 anos da industrialização em São Paulo.

Não só "IstoÉ Senhor", evitou o assunto, como também o Palácio dos Bandeirantes emudeceu, quando podia informar porque o banco gastou no primeiro semestre do ano passado com publicidade em "IstoÉ Senhor" mais do que o total da propaganda que veiculou nos jornais e rádios de São Paulo, somados. O ex-governador Quércia, candidato à Presidência da República, da mesma forma, faria bem se esclarecesse que a publicação de tanta propaganda na revista não tem relação com um eventual apoio à sua candidatura. Feitos esses esclarecimentos, mudaríamos afinal de assunto.

ALTA E BAIXA

ALTA para a Folha, pela vitória obtida no processo que o governo Collor movia contra o jornal. A resistência do jornal foi histórica e contribuiu para revigorar as raízes da liberdade de imprensa e alterar a atitude do governo Collor frente à sociedade.

BAIXA para a Folha, por responsabilizar e condenar a priori o médico Vicente Odone Filho, chefe da unidade de Onco-hematologia do Hospital das Clínicas, depois que este assumiu erro médico cometido no tratamento do garoto Daniel Ferreira Gomes Carneiro, 4. O ombudsman recebeu oito cartas de pais de crianças cujas vidas foram salvas pelos esforços do médico e de sua equipe. Todas as cartas protestavam contra a forma persecutória com que o assunto foi tratado na capa do caderno Cotidiano.

ALTA para a Folha, por ter revelado a primeira pista que levou à descoberta de que os artigos que o presidente Collor publicou em alguns jornais do país eram na verdade textos plagiados do diploma e ensaísta José Guilherme Merquior.

BAIXA para a Folha, por ter retirado a cor de alguns de seus cadernos. O prejuízo mais evidente nos cadernos Mundo e São Paulo sp, que circula apenas na capital.


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