Folha de S. Paulo


Os fiscais dos fiscais

Como ombudsman recebo de 20 a 30 cartas por dia. São manifestações críticas na grande maioria, de leitores que em geral têm grande interesse por ou são especialistas em um determinado assunto. Com a criação do ombudsman a Folha acabou estimulando uma nova sensibilidade. A imprensa, vigia da sociedade, é ela própria fiscalizada pelos leitores.

Detalhes que antes passavam ignorados ficam evidentes. Os leitores mais atentos se preocupam em apontar informações erradas ou em questionar decisões jornalísticas e editoriais. Alguns trechos de cartas são reproduzidos a seguir.

O critério de escolha é subjetivo: são as que me parecem mais interessantes e capazes de interessar a um maior número de pessoas. O critério equivale ao que é usado pelos jornalistas numa redação.

As cartas vão reproduzidas apenas com as letras iniciais do nome de seus autores. Todas foram resumidas e algumas foram editadas por razões de espaço e para facilitar a compreensão. O objetivo é tornar público o tom geral das reclamações feitas pelos leitores mais críticos e mais comprometidos com o jornal, o que pode ser útil, em especial para os que o produzem:

"Sr. ombudsman,
Desculpe-me por não chamá-lo pelo nome. Sinceramente, é que não sei o seu nome. Sei a sua função. Mas, talvez, essa minha pergunta e a sugestão não devessem ser encaminhadas para o ombudsman. Isso também não sei. Agora, enfim, o que sei: Na primeira página do Cotidiano do dia 14 de novembro, a Folha apresentou nove dicas para evitar a Aids. Informações bastante úteis, mas que deixaram dúvidas. Vocês afirmaram que é arriscado beijar na boca e que relações sexuais anal e vaginal transmitem o vírus. Afinal, no sexo oral não há risco de contaminação?" (S.A.M., Curitiba).

"A Folha prestou um grande serviço a seus leitores publicando o tão esperado caderno sobre a vida e obra de Artur Rimbaud. Mas permitam-me dizer não me pareceu satisfatória a tradução do "Le Bateau Ivre" feita por Augusto de Campos. Não que ela estivesse mal escrita. Mas por mais competente e erudito que seja o tradutor, uma versão metrificada e rimada termina revertendo em traição ao autor da obra traduzida" (F.B.L, Três Rios-RJ).

"Tanto alarde para anunciar a nova seção TV Folha. Que ela iria facilitar o leitor no acompanhamento da programação das emissoras etc. De maneira geral está razoável, mas ela piorou onde eu achava que devia melhorar, que é na divulgação da programação semanal das pessoas que serão entrevistadas nos programas "Jô Onze e Meia" e "Programa Livre" além de dizer o tema que "Documento Especial" irá abordar" (A.R.A., Recife).

"Venho pela presente agradecer-lhe pela publicação parcial de minha última carta. Já senti melhoras nas críticas e observações do sr. Clóvis Rossi... Estou indo mais animado para o trabalho..." (as reticências sçao do leitor O.V.A., São Paulo-SP).

"A Folha iniciou uma guerra enjoativa contra o governo. Nessa, guerra, é motivo de notícia de Primeira Página, em letras garrafais, a opinião do ex-presidente Sarney. Como nós leitores poderemos interpretar esse fato a não ser como um tiro histérico contra o inimigo pessoal da Folha, presidente Collor?" (L.C.S.G., Presidente Prudente-SP).

"Creio que o amor da Folha pelo diretor Gerald Thomas está chegando a contornos "zelianescos". Certo que ele se trata de uma referência importante do teatro da atualidade, mas a Folha noticia até os resfriados do diretor" (A.A.S., Cascavel-PR).

"Ao abrir o suplemento da Ilustrada deste dia 14 deparei com uma grave falha de informação: desde quando David Bowie tem olho de vidro?!" (A.V.E., Campinas-SP).

"Me indignei com a ilustração do desenhista Osvaldo, na coluna "Painel" na matéria intitulada "ausência sentida" e referente aos meninos-garis de Marabá. O desenho traz o rosto da deputada Rita Camata e a figura de um menino-gari, só que este último não tem feições humanas, mas simiescas. Em qualquer país onde a discriminação racial é levada a sério, tal desrespeito seria proibido; no Brasil, talvez passe mesmo despercebido" (S.M.B., Brasília).

"És inaudito e increíble que um jornal con el 'status' de la Folha de S. Paulo sea capaz de aceptar de su corresponsal Xico Sá um artículo com semejante titular tan racista e ignorante como el de 'Estatura do homem nordestino já se compara à de pigmeus africanos'. És una afirmación racista por el solo hecho de comparar esa tribu africana con los desgraciados de este país, o sea los nordestinos. Por que?" (M.H., Curitiba).

"Agora vejo confirmado que o jornal considera essencial 'um pouco' (para não dizer muito) indecente no campo moral como um requisito mercadológico. Considerando que não concordo de maneira nenhuma com esta postura venho devolver através de V.Sa, o carnê de renovação de minha assinatura" (A.B.C., Santana de Parnaíba-SP).

"Este jornal vai fechando seu leque para 1% do 1% de leitores brasileiros. Exemplos de manchetes indecifráveis: 'Jarman metaforiza paranóia homófoba'. A Folha pode optar pela informação. Ou pode, numa outra alternativa tentadora, assumir sua fase de 'revista de bordo da Varig'. Aí perdemos o risco de perder o único jornal legível do país" (A.G.B., Belo Horizonte).

"Em época de chuva dificilmente conseguimos ler a Folha. Os irresponsáveis entregadores, com apoio dos irresponsáveis da agência, procedem sempre atirando o pacote de jornais no solo molhado ou em cima dos arvoredos ou até (incrível) no terreno baldio ao lado!" (J.J.L., Campinas-SP).


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