Folha de S. Paulo


O império contra-ataca

Amanhã começa uma nova escaramuça da mais duradoura e interessante disputa da mídia nacional nas últimas décadas: o centenário jornal "O Estado de S. Paulo" lança sua edição das segundas-feiras.

A iniciativa era prevista, e também temida, há anos pela Folha, que faz tempo batia no peito e se gabava com certa razão de que estava todos os dias nas bancas, de que seus assinantes recebiam mais exemplares pelo dinheiro pago, de que muitos fatos importantes haviam ocorrido nos domingos e os leitores de "O Estado" deles só tomavam conhecimento nas terças-feiras.

De fato, a renitência de "O Estado" em se adaptar às imposições de um ambiente dependente de doses diárias e crescentes de informação foi singular, uma atitude que parecia conjugar certo ar blasé da aristocracia decadente europeia com o conformismo do caboclo latino-americano.

Ele é o último dos grandes diários brasileiros a conseguir preencher a hiato do fim de semana, muito comum até a década de 60. Durante apelo menos vinte anos, quando já estava evidente que havia um mercado para as edições de segunda-feira, "O Estado" assitiu com passividade granítica o crescimento da Folha.

Foi nesse mesmo período que a Folha partiu de uma posição secundária em São Paulo para liderança dos jornais do país. Além da precedência comercial, "O Estado" perdeu algo muito mais caro para jornais de prestígio. Cedeu à Folha influência junto às elites empresariais, universitárias, sindicais e culturais, que afinal são quem mais lê jornais sérios tanto no Brasil como em qualquer país.

Mas há outro fator talvez ainda mais importante. Enquanto cedia mercado, "O Estado" permitiu também que aos olhos da opinião pública a Folha erguesse uma plataforma distanciada da tradição da imprensa de São Paulo, de onde passou a emitir uma voz original e estridente na defesa de valores que essencialmente ele próprio - "O Estado" - antes empolgava.

De alguns anos para cá, "O Estado de S. Paulo" tem afastado a letargia na busca de recuperar terreno. Após um período em que as iniciativas nesse sentido acabavam sendo entendidas como meros clones do pluralismo e da forma dos cadernos da Folha, parecia estar havendo uma atenção silenciosa para temas cruciais do jornalismo.

Tinha-se a impressão de que "O Estado" conseguia fazer progressos na qualidade - leia-se clareza e concisão - do seu texto jornalístico, uma debilidade estrutural que atormentava gravemente a Folha e seus leitores, comprometendo a qualidade de de inúmeras reportagens.

Com a edição de segunda-feira e a introdução da impressão à cores, "O Estado" ao mesmo tempo em que acrescenta recursos para tentar reverter a seu favor as tabelas de circulação (veja quadro acima), corre o risco de ver reafirmada a ideia de que seja um veículo temporão, que adota soluções, por mais que não seja essa a intenção, j[a consagradas pelo concorrente.

A partir de amanhã, a palavra fica com Folha. Será ela capaz de elaborar estratégias jornalísticas capazes de elevar seu produto a uma nova qualidade ou se bastará com esquemas destinados a anular as iniciativas do competidor?

A temporada da hiperconcorrência entre os grandes jornais paulistas está, mais do que nunca, aberta.

ALTA E BAIXA

ALTA para a Folha, que melhorou a qualidade se seu papel de impressão. Efeitos de hiperconcorrência.

BAIXA para a SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), cujo relatório final sobre ameaças à liberdade de imprensa não cita o processo do governo Collor contra a Folha. A SIP era presidida pelo diretor de "O Estado", Júlio César Mesquita. Deslizes da hiperconcorrência.

BAIXA para a Folha por noticiar na quinta-feira que o jogo Santos x 15 de Piracicabda seria no estádio da Vila Belmiro, em Santos. Ao menos, um leito foi de São Paulo para Santos a fim de assistir a partida. Lá, encontrou o estádio vazio. Na quarta-feira à noite, ainda a tempo de ser noticiado pelo jornal, o jogo fora transferido para o estádio do Pacaembu, em São Paulo.


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