Folha de S. Paulo


Ilusão de ótica

Sobrevive em concepções passadistas do jornalismo o olhar que reduz a fotografia a adorno, com função exclusivamente estética. Conforme esse anacronismo, a imagem seria para o texto o que a moldura é para a pintura: uma companhia desimportante.

Como afirma o "Manual da Redação", "a maneira mais convencional e acomodada de encarar a fotografia é tratá-la como um mero complemento da informação escrita. [...] O recurso visual do jornalismo impresso moderno deve ser entendido como uma possibilidade [...] suplementar à informação textual".

Na quarta, o Senado absolveu seu presidente, Renan Calheiros, em processo de cassação. O país sabe hoje mais sobre os negócios do antigo devoto collorido, depois fernando-henriquista e agora lulista que antes das revelações inauguradas com um "furo" da revista "Veja".

Mesmo sem brilho, a Folha fez um bom trabalho e cumpriu o papel jornalístico de fiscalizar o poder. Na essência, fez o que deveria fazer. Em contraste, durante a crise em curso o jornal veiculou fotos que sugeriam o abandono do presidente do Congresso. Ou seja, desinformou -Renan estava longe do isolamento.

É compulsório, mas insuficiente, não manipular imagens e recusar encenações ludibriantes. Como a fotografia, feito o texto, é unidade informativa, ela deve retratar a realidade, e não distorcê-la. Ao exibir Renan solitário em meio a cadeiras vazias, a informação nem tão subliminar era que ninguém o acompanhava.

Igualmente impróprio é mostrar Renan olhando para um lado e José Sarney para o outro. Mensagem: eles divergem. Fato: são aliados.

O fotojornalismo interpretativo pode, no entanto, informar melhor que um tijolaço de escritos. Quando Lula aparenta passar a mão na cabeça de Renan, evidencia-se a bênção do Planalto.

Como na fotografia do general-presidente (1979-85) João Baptista Figueiredo à civil, mas dando a impressão de usar o quepe que era de um militar atrás dele.


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