Folha de S. Paulo


O futebol precisa evoluir, e o Brasil precisa amadurecer

É difícil morar numa cidade que está se despedaçando e dar a mínima para quem ganhou os jogos da rodada, se foi ou não gol de mão ou se o Brasileiro deve ter VAR (video assistant referee), sigla em inglês para árbitro assistente de vídeo.

Parece tudo tão superficial diante das imagens das pessoas se jogando no chão nas vielas da Rocinha, o acesso a São Conrado fechado, o ônibus na orla pegando fogo. A rotina da zona sul e parte da zona oeste da cidade foi chacoalhada como eu nunca tinha visto em cinco anos morando por aqui.

Mas nada diferente do que acontece no dia a dia de boa parte das favelas do Rio, bem longe da rotina dos ricos e remediados. Há meses crianças da rede pública têm sido impedidas constantemente de frequentar a escola. O que aconteceu nesta sexta (22) na parte mais nobre não é novidade para os pobres.

Estamos falando da cidade que sediou a Olimpíada há um ano, que viveu algumas das semanas mais festivas da sua história.

Mas, vamos lá. O grande problema do futebol é o uso do árbitro do vídeo, uma discussão desnecessária, uma perda de tempo. Negar o uso dessa tecnologia serve apenas para adiar o uso dela. O futebol precisa se modernizar, assim como já aconteceu com outros esportes.

Passamos dias discutindo se foi gol de mão ou não. Jô vai ser chamado de canalha para todo o sempre. Agora a discussão é sobre a decisão da CBF de utilizar o recurso já na próxima rodada. E dá-lhe análises e mais análises de especialistas sobre o assunto.

É muito cedo. A CBF está se precipitando. Não podem mudar as regras no meio do campeonato. É todo tipo de bobagem para adiar o inevitável. Fica a pergunta: a quem não interessa o uso do VAR? Ao público, aos jogadores, aos clubes ou aos especialistas?

Que seja liberado, que aconteçam os erros inerentes a uma mudança dessas. É claro que será uma grande revolução na história do futebol, mas os exemplos têm sido positivos. Na Europa, o árbitro de vídeo já é realidade e tem acabado com polêmicas desnecessárias. Bem, talvez seja esse o problema para os mais conservadores.

Fica óbvio que muita gente não tem o menor interesse de colocar um fim nas divergências que aparecem no debate esportivo. E lances que poderiam ser resolvidos pela tecnologia seriam eliminados das discussões. É isso que também alimenta as mesas-redondas, as conversas de bar, os posts em redes sociais. Com o fim disso, sobra o que para ser discutido? Ora, a qualidade do futebol jogado. Mesmo que ela esteja em baixa no momento.

Os mais conservadores dizem que a tecnologia vai acabar com a emoção do jogo, vai gerar paralisações desnecessárias. Ora, tudo depende das regras. No vôlei há um limite de vezes em que o árbitro de vídeo pode ser usado, justamente para evitar o abuso. Quando é acionado, resolve a questão em menos de um minuto.

No futebol já vimos jogos serem paralisados por mais de 10 minutos pelas brigas geradas em lances polêmicos. A tecnologia resolveria isso. Resta à CBF colocar as mãos no bolso para bancar os R$ 15 milhões anuais -o que não deve ser um problema, convenhamos- e se adequar às regras da Fifa. Não tem mistério.

O futebol precisa evoluir e o Brasil precisa amadurecer. Por incrível que pareça uma coisa tem a ver com a outra.


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