Folha de S. Paulo


Os homens também choram

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Close up of a back view of a couple walking and holding hands on the beach at sunrise. Maos dadas , namoro , romance , namorados , passeio, praia , amor. Credit: Fotolia ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Homens também sofrem com traições e rejeição de mulheres em relacionamentos

O título deste texto poderia ser "As mulheres também não prestam". E eu tive que explicar isso com cuidado a um amigo que está sofrendo como um cachorro que foi abandonado em véspera de feriado. Do mesmo jeito, sem tirar nem por, que a maioria das mulheres pena todos os dias por se relacionar com caras que não valem o lenço para tirar a maquiagem borrada.

A diferença é que a gente se acostumou a sofrer, a aceitar que histórias de amor são sempre difíceis e recheadas de sofrimento –esta é a minha única bronca em relação às fábulas de princesa. Nesse sentido, os homens sempre levaram uma baita vantagem porque foram criados ouvindo que menino não chora, não sofre, quando cresce tem que passar o rodo. Quase sempre começavam e terminavam relacionamentos quando queriam. O jogo está mudando, amores. Ahh se está.

E agora vocês precisam lidar com a vida como ela é. Isso não tem nada a ver com feminismo, com empoderamento, com liberdade sexual, pelos quais nós temos batalhado. Tudo é bem mais complicado do que textão de Facebook e está relacionado ao fato de que algumas pessoas não prestam, são dissimuladas e mentirosas, inclusive muitas mulheres. É novidade? Não exatamente.

A diferença é que algumas moças não fazem mais a menor questão de disfarçar esse traço de falta de caráter. Assim como os homens sempre fizeram, respaldados na crença de que canalhice é uma característica masculina nata. Homem é tudo igual, sabe como é? Não são. O mundo está cheio de caras decentes em meio a outros tantos que não valem nada.

E muitos, os legais e os babacas, estão descobrindo que mulheres seguem a mesma cartilha quando o assunto é relacionamento. Você muito provavelmente vai cravar vagabunda ou piranha na testa de moças que, sem remorso, plantam na cabeça chifres pontudos ao mesmo tempo que dilaceram corações.

Em tempos de igualdade, amém, o que cabe de fato em casos de rejeição, traição, punhalada nas costas é bem mais universal e serve para meninos e meninas: cafajeste, pilantra, canalha. Alcunhas que talvez tenham ressoado de forma nada gentil em seus próprios ouvidos ou por meio de mensagens desaforadas no celular e que agora podem ser endereçadas às moças, de igual para igual.

Não foi tarefa fácil dar a real ao meu amigo rejeitado e chifrudo.

Fui explicita. Mulher mau-caráter é capaz de fazer exatamente o que homem mau-caráter faz. Não, mentira. É capaz de fazer muito melhor, porque pinta, borda, faz charminho, exagera nas promessas, fala que ama, chora de arrependimento, pede desculpas, tudo com beicinho. Exatamente como muitos malandros, mas com uma dose hollywoodiana de drama e dissimulação, meus amigos. E vocês acreditam em tudo, porque não é o que se espera de uma mulher, ainda mais quando você resolveu que quer essa mulher para você. Como assim, ela não me quer? Well... aceita que dói menos.

Não sei lidar com marmanjos que choram. Falta de costume, porque isso acontece com a mesma frequência da passagem do cometa Halley pelo Sistema Solar.

Homem, quando pega uma pilantra pela frente, sofre mais do que menina na primeira fila do show do Justin Bieber. A mulher terminou, voltou, terminou, voltou, terminou e meu amigo lá, vestindo a fantasia de panaca, esperando a rapariga descobrir se gostava dele –o que não aconteceu, e só quem está de fora sabe que nunca acontece. A moça jogava a autoestima do cara no chão. Mentia. Seduzia. E ainda colocou a culpa na libido exacerbada pelo fracasso da relação e a pulada de cerca bem-sucedida. Só faltou coçar o meio das pernas, levantar a sobrancelha e dizer: sabe como é mulher, né?

Aquele homão, que já tinha feito meia cidade sofrer exatamente como ele estava agora, provando de sua babaquice. Sei o script direitinho. A gente se culpa. Acha que fez alguma coisa errada. Tem a sensação de que aquela dor não vai passar nunca. De que jamais vai se interessar por alguém. Vive a tortura de pensar no outro feliz enquanto sente-se miserável. Nutre a esperança ridícula de tentar de novo mesmo sabendo que faz papel de bobo. Emagrece –e essa é a única parte boa.

Me diz que vai passar, ele me pediu. Claro que passa.

Havia tantas indagações, culpa, insegurança, falta de amor próprio e medo naquele homem sentado à minha frente. Já vi marmanjo sofrer. Consolar mulher é muito mais fácil. A gente fala "amiga, homem é tudo igual, nenhum presta", algo em que eu definitivamente não acredito, mas uma desculpa que funciona. A moça sente-se melhor, menos otária e logo está pronta para fazer papel de palhaça de novo. Porque a gente sempre faz. Tenho um currículo tão extenso que não sei como não fui parar num circo.

Homem, não. Homem demora um tempão para acreditar que canalhice não tem gênero. Mas a dor de corno muitas vezes tem um efeito positivo: o de transformar meninos mimados em homens sensíveis. Por causa de todo esse sofrimento, meu amigo ligou para uma ex, uma que ele abandonou, sem olhar para trás e dar satisfação, e pediu perdão. Como o que o Brad Pitt fez com a Jennifer Aniston depois de 12 anos.

Meu amigo, entre uma lágrima e outra, também pediu que eu lhe apresente uma amiga que está solteira. Não disse que passa?


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