Folha de S. Paulo


Brasil, um país de cornos

Ser corno é uma das piores coisas da vida. Levamos muito tempo negando o que todo mundo já sabe, que a gente é corno. O chifrudo é quase sempre um iludido, ludibriado, crente. É traído em suas convicções, em suas paixões, em sua lealdade. Tenho pena do cornudo. Já fui uma. Quem nunca? Quem nunca ficou cego pela fantasia do amor, inebriado pelas promessas de felicidade, um tanto emburrecido em prol de relação fracassada?

Ahhh, os cornos. Coitados deles, coitados de nós.

Vimos nos últimos dias que o Brasil é um país de cornos. O pior tipo de chifrudo, aquele que é usado, enganado, passado para trás, descobre a traição, vê as provas, uma, duas, três vezes e continua em negação. Diz ele que todo mundo é cornudo, que a vida é assim, que ele foi chifrado menos vezes do que os outros, que foi corneado para tirar os pobres da miséria, que aceita todos os defeitos morais do seu ídolo para não deixar o Brasil virar a Venezuela, que antes corno do que socialista, que prefere ser corno porque pelo menos agora os pobres podem andar de avião.

Com vocês o corno de político. Mas desses não dá para ter pena. Corno de político merece toda traição.

Pedro Ladeira/Folhapress
A lista de Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo, tem cerca de 1/3 do congresso
A lista de Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo, tem cerca de 1/3 do congresso

Brasília acabou. A política brasileira atual acabou. Cerca de 1/3 do nosso Congresso aparece na lista do "fim do mundo". Ministros, governadores, prefeitos. Todos lá na delação de uma única empresa. Tem gente se gabando que esse ou aquele político não são citados. Ora, não são citados porque eram inexpressivos. Não são citados nesse escândalo. É ingenuidade acreditar que todas as estatais federais e estaduais não estejam sujas também. Mas tem gente que acredita. Como eu disse, bando de cornos.

Emílio Odebrecht diz que o Brasil funciona assim há 30 anos. Ou seja, ele diz que é prática na gestão de todos os presidentes do Brasil democrático. Podemos considerar que a corrupção é também democrática, passou de um presidente para outro. Contemplou governadores, prefeitos, políticos do legislativo de todas as esferas.

Não sobra um.

O que todos os brasileiros deveriam fazer? Deixar essa gente, os políticos, abandonada, sem respaldo, sem apoio, com medo de sair nas ruas. Engolir o orgulho, enxugar as lágrimas de decepção, assumir o chifre, abraçar os "inimigos", encher a ruas de gente e pedir a cabeça do presidente e do Congresso inteiro.

O que as pessoas fazem desde anteontem? Saem em defesa de políticos. Continuam se matando nas redes sociais. Discutem quem é mais ou menos corrupto. Tem corno #lula2018, corno #bolsomito2018, corno #dilmãe, corno #voltaFHC. Acredite, tem corno na página de Paulo Maluf defendendo sua honra. Só não vi, por enquanto, corno do Picolé de Chuchu, porque a pessoa é muito sem carisma mesmo.

Fala-se na articulação de um pacto entre Temer, Lula e FHC pela "sobrevivência" dessa classe política podre atingida pela Lava Jato, incluindo os três. Enquanto isso, nós, o bando de chifrudos, continua como numa torcida histérica ajudando a salvar um monte de bandido e a acabar de afundar o que restou do Brasil.

Atrás de um corno manso há sempre um político feliz. E rico. Estamos de parabéns.


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