Folha de S. Paulo


Viajar é caro, mas não tem preço

Esta coluna foi escrita a bordo de um avião, com destino à Tailândia. Que exótico. Que longe. Que caro. Que luxo. Essas reações têm algumas verdades. O meu destino é um tanto diferente do que estamos acostumados em nossa vidinha "arroz com feijão" e bastante distante, levando em conta que são nove horas de diferença de fuso horário.

As verdades acabam aí.

É minha segunda vez no país em três anos. Peguei amor na primeira viagem. Mas este não é um texto sobre turismo e, sim, como nos convencemos de que o desconhecido é caro, é luxuoso e, portanto, inacessível. Talvez porque a gente esteja acostumada a viver num país em que as coisas funcionam assim. Ou porque não funcionam.

Por exemplo, uma passagem na alta temporada para uma praia badalada na Bahia pode custar facilmente mais do que paguei para ir à Tailândia. A Bahia é um dos meus lugares favoritos no mundo, mas nem todos os santos me fariam gastar tudo isso para comer acarajé e moqueca, entre um mergulho na água morninha e uma soneca na rede.

Viajo pela Emirates, considerada uma das melhores companhias do mundo. Tinha boa lembrança de uma viagem há uns dez anos entre a Austrália e a Nova Zelândia e lembro de ter ficado bem impressionada. E aí todo mundo arregala os olhos: mas deve ser uma fortuna! Bem, eu viajo de classe econômica e paguei R$ 2.500, em nove vezes sem juros para ir até o outro lado do mundo.

Mesmo na econômica o atendimento tem toques de executiva. Todos os passageiros recebem nécessaires fofinhas com meias, escova de dentes e máscara para dormir. Tem cardápio com múltiplas escolhas de refeição, que é bem mais simpático do que a maioria dos comissários de bordo repetindo "pasta ou frango", antes de lhe entregar uma bandejinha com comida amassada.

Falei que os talheres são de verdade e os guardanapos também? Pois é. Tem mais, o ar-condicionado não congela e não resseca todos os poros do corpo. Dentro do possível, torna uma viagem de mais de 20 horas uma experiência longe de ser uma tortura. Posso imaginar o que deve ser a primeira classe. Na verdade, duvido que minha imaginação seja capaz. Falei que tem wi-fi? Duas horas de graça, funciona e a conexão é rápida.

Contei tudo isso porque a gente se convence o tempo todo de que tudo que é bom não é para o nosso bico. Deixamos de sonhar, imaginar, planejar. Fazer uma viagem como essa depende muito mais de planejamento do que de qualquer outra coisa.

Passei dias pesquisando passagens, de olho em promoções, procurando hotéis, comparando sites, analisando opções, definindo itinerários, decidindo se era melhor avião, balsa, lancha. Dá para gastar menos na Tailândia em duas semanas do que em um feriado num resort no Brasil. O custo Brasil acaba com nossos sonhos.

A comida de rua é uma alternativa real para quem quer economizar. Um prato tradicional de macarrão de arroz com frango e legumes não custa mais do que R$ 10 e é maravilhoso. Claro que ninguém vive só disso, mas o que não faltam são opções baratas. Falei que vende besouro, escorpião e toda variedade de insetos, fritinhos e crocantes? Tem, mas não tive coragem de comer. Quem sabe dessa vez.

Assim como a hospedagem. Você pode gastar um caminhão de dinheiro em hotéis suntuosos, pouco dinheiro em outros um tantinho menos suntuosos e muito pouco em alternativas mais modestas. Com a internet dá para descobrir se o lugar é bom, ruim, se as pessoas adoraram ou detestaram, se tem carrapato na cama.

Mas o que mais me fascina em conhecer lugares tão diferentes da nossa realidade são as pessoas. E o tailandês, conhecido como "povo sorriso", é uma das maiores preciosidades do país e uma das razões da minha volta. Poucas coisas são mais simpáticas e acolhedores do que o cumprimento com reverência que se faz no dia a dia. Não vejo a hora.

Viajar é caro, é verdade, mas pode ser muito menos do que se imagina. Viajar é um tanto supérfluo, é verdade, mas se encaixa na categoria de bens que a gente compra para ficar mais rico. Enriquecemos culturalmente, expandimos nossos horizontes, derrubamos tabus, acabamos com preconceitos. Viajar é caro, mas como diz aquela propaganda de cartão de crédito, não tem preço. Até tem, mas dá para parcelar em nove vezes sem juros.


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