Folha de S. Paulo


Os homens não são mais os mesmos, ainda bem. E graças ao esporte

O segundo assunto mais comentado desta semana foi a prisão do ex-deputado Eduardo Cunha. O primeiro foi o agente hipster-gato-lenhador da Polícia Federal Lucas Valença. Você pode não ter visto as fotos para entender o fuzuê em torno do moço. Em horas, ele já tinha nome e sobrenome, perfil em sites de notícia e saltou de pouco mais de mil seguidores no Instagram para 190 mil.

O que isso tem a ver com esporte? Tudo. Tudo culpa do esporte. Ou melhor, graças ele. Lucas é filhote da evolução de um fenômeno que começou na metade da década de 1990, quando o jornalista inglês Mark Simpson criou o termo "metrossexual" para definir o homem preocupado com sua aparência.

O maior ícone da categoria sempre foi o jogador de futebol David Beckham. No rastro dele, vieram dezenas de outros atletas de futebol, tênis, beisebol, rúgbi, futebol americano, natação, ancorados em corpos esculturais, dinheiro e fama para alavancar um mercado até então bastante tímido, o da vaidade masculina.

Nas duas últimas décadas, cansamos de ver atletas em propagandas de cueca, perfume, lâminas de barbear, ternos Armani. Os cabelos bem cortados, as barbas bem-feitas, aquele jeito de menino criado a leite com pera e talco na bunda, além de barrigas-tanquinho milimetricamente esculpidas, serviam ao propósito de vender mais e mais produtos para homens igualmente vaidosos.

Vinte anos depois, o metrossexual que vemos por aí é praticamente um homem convencional perto da revolução percebida pelo próprio Mark Simpson. Pela atualização do jornalista, o termo mais apropriado para a nova onda entre os homens é "spornosexual".

A palavra combina "esporte" (culto ao físico) e "pornografia" (fetiche). E, adivinhe, seus embaixadores mais emblemáticos são justamente atletas, muitos deles jogadores de futebol. É, sim, mais uma revolução no comportamento masculino. A questão vai além de ser engomadinho, descolado e com atitude. O homem aqui não quer ser um ícone da moda, vide Beckham, causando ao usar saia. O homem quer ser desejado.

Tem menos a ver com a roupa que vestem e mais com o que não vestem. O produto que o "spornosexual" vende é seu corpo, no mercado online das redes sociais, com fotos no Instagram e vídeos no Snapchat. O "spornosexual" quer aplausos para seus músculos meticulosamente trabalhados em academias, suas tatuagens, seus brincos, seus cabelos transados. Não por acaso, as academias são cenário de muitas dessas fotos, além da praia, do banheiro e da cama. O espelho é seu melhor amigo.

O fenômeno é muito significativo porque o homem não precisa ser um jogador de futebol famoso e rico para vender um produto. Ele já é o produto. No Instagram do agente-gato da PF, por exemplo, há várias selfies sem camisa, uma marca da categoria. Apenas uma delas tem quase 20 mil likes. Vídeo na cachoeira, 88 mil visualizações. Consumidor, como se vê, é o que não falta.

Para Mark Simpson, essa revolução não veio para tornar os homens mais femininos ou gays. É mais uma possibilidade para que se tornem o que têm vontade, exatamente o que as mulheres têm sido encorajadas.

Muitos dirão que os homens não são mais os mesmos. Ainda bem. E, veja só, graças ao esporte, sacrossanto reduto machista.


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