Folha de S. Paulo


Ficar gordo ou ficar pobre?

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Hoje, a coisa mais normalzinha no cardápio de quem resolve perder peso é suco verde
Hoje, a coisa mais normalzinha no cardápio de quem resolve perder peso é suco verde

Alguém, por favor, me explica o que aconteceu com biscoito água e sal, Polenguinho, gelatina e iogurte desnatado, porque eles desapareceram das dietas. Eram estrelas nos anos 1990. Hoje, a coisa mais normalzinha no cardápio de quem resolve perder peso é suco verde. Couve, hortelã, maçã, gengibre, limão. Tudo batido. Mas é cardápio para iniciante. Quem manda não seguir blogueira fitness?

Nesta quarta (28), passei duas horas em frente à nutricionista contando a triste história do por que engordei. Contei com todos os detalhes, como se estivesse numa sessão de psicanálise. Era uma sessão de psicanálise. Custa tão caro quanto a hora do meu psicanalista. E o efeito é parecido. Quase tive que pedir um lencinho. À medida que narrava como tudo aconteceu, comecei a ouvir minha própria voz no silêncio daquele consultório bonitão, enquanto escorregava no sofá, sob os olhos atentos da nutricionista sarada e bonitona. Ao final, eu queria me esconder embaixo da mesa, de vergonha dela e de mim mesma.

Eu poderia ter poupado aquelas horinhas e apenas ter assumido que engordei porque ando preguiçosa. Faz cinco anos que ando preguiçosa. Nesse meio tempo fiz todos os exames para provar a mim e ao mundo que alguma coisa estava errada comigo. Quatro vezes para ser mais exata. Eu queria poder fazer uma cara triste e dizer "tireoide", "metabolismo lento", "hormônios femininos em queda livre". Todos olhariam com pena para os meus quilos a mais e eu ganharia algum remédio para emagrecer sem esforço. Que sonho. Nada feito, é só preguiça mesmo. E o único remédio é comer melhor e menos, e me exercitar mais. Lá fui eu para a nutricionista.

Por que eu quero perder peso? Porque quero cuidar da minha saúde, dormir melhor, não ter gases ou prisão de ventre, acabar com o refluxo, fortalecer os ossos e o sistema imunológico, ficar com os cabelos lindos e a pele viçosa. Quero envelhecer de forma saudável, ter mais rotina, tomar mais água, comer mais alimentos orgânicos. Mentira. Eu queria gritar: doutora, só quero ficar assim, magra e gostosa, como você.

Saí de lá com um cardápio, várias dicas de comidinhas que tentam nos convencer de que tudo isso é mais gostoso do que picanha e cerveja. Não são. Mas vamos lá. Perdi mais da metade do dia, entrando em sites, encomendando coisas das quais nunca tinha ouvido falar. Na minha lista tem itens que só de pronunciar o nome já me sinto magra. Salgado maromba, bolacha de arroz integral, manteiga ghee, pasta de castanha, kombucha. Como não sentir-se fit imediatamente com uma lista de comidas que ou são esquisitas ou não são apetitosas? Amanhã acordarei magra, só de ter comprado tudo.

Pode sopa. Adoro sopa. Sei uma de abóbora com carne e creme de leite, fica uma delícia. Não pode carne nem creme de leite. Claro que não pode. Lembram da dieta da sopa? Cozinhava todos os legumes mais sem graça do mundo, batia no liquidificador e passava uma semana tentando não cortar os pulsos de fome. Todo mundo desistia, menos a Adriane Galisteu, que ficou magra, saiu na "Playboy", virou apresentadora e ainda ganhou dinheiro vendendo uma dessas dietas.

No final do dia, fiz as contas e acho que dá para passar uma semana num spa com o que se gasta em comida de gente sarada, suplementos, vegetais orgânicos, probióticos, chás, drenagem linfática. Fico gorda ou fico pobre?

Lembrei da nutri, magra e sarada, e resolvi desengavetar os projetos #correndonapraiadebiquinibrancoverão2014, #bundananuca2015 e o #barriganegativa2016. Se é para fazer, que seja direito. Lanchei a tal bolacha de arroz, que tem gosto de isopor, mas não é muito pior do que Polenguinho.

Não vou desistir. Por enquanto ela não sugeriu churrasco de melancia. Se tudo der certo, no final do ano posto a foto #correndonapraiadebiquinibrancoverão2017, no Instagram. Espero que sobre dinheiro para o biquíni.


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