Folha de S. Paulo


Rio pode ter a melhor Paraolimpíada, mas não dá para descuidar do básico

Lembram o forrobodó na chegada da delegação da Austrália na Vila Olímpica poucos dias antes da abertura? Vazamentos, fios desencapados, entulho e sujeira. Na chegada dos para-atletas, houve mais insatisfação.

A repercussão de agora foi infinitamente menor, ao menos na imprensa brasileira, mas no começo da semana as reclamações do Comitê Paraolímpico da Irlanda foram parar nos jornais ingleses.

Eles dizem ter encontrado apartamentos sujos e que tiveram que esfregar as dependências para conseguir remover toda a sujeira. "Foi feita uma limpeza rudimentar, mas, para ficar como gostaríamos, tivemos que fazer", disse o chefe-executivo do comitê irlandês, Liam Harbison, ao "Daily Telegraph".

Também reclamaram da necessidade de contratar motoristas, pagando do próprio bolso, para garantir o transporte da delegação durante a estadia no Brasil, o que não estava sendo feito pela organização.

O comitê irlandês confirmou à Folha as reclamações. Disse que desde terça (30) eles têm trabalhado junto com a organização para que problemas sejam resolvidos e houve progresso. "Esperamos que as soluções continuem no mesmo caminho à medida que os Jogos se aproximam", declarou John Fulham, chefe de comunicação do comitê da Irlanda.

Desde antes do final da Olimpíada, sabe-se dos problemas de caixa para a realização da Paraolimpíada porque parte dos recursos foi usada na Olimpíada. Falava-se que os cortes afetariam as arenas (fechamento do Parque Olímpico de Deodoro), o transporte e o número de trabalhadores. Pelo visto, faltou gente (ou fiscalização) para faxinar direito os apartamentos.

Na ocasião, o presidente do Comitê Paralímpico Internacional, Sir Philip Craven, disse: "Nunca antes em 56 anos da história da Paraolimpíada nos deparamos com circunstâncias como essa".

Desde metade de agosto, o prefeito Eduardo Paes tentava na Justiça a liberação de R$ 150 milhões de verba pública para amenizar o problema, que obviamente não poderia ter acontecido.

O velocista inglês Jonnie Peacock disse que a organização "deveria sentir-se envergonhada" por usar dinheiro destinado à Paraolimpíada para cobrir buracos da Olimpíada. O temor seria de que os para-atletas voltem a ser tratados como "cidadãos de segunda classe".

É vergonhoso que isso possa ser uma possibilidade, ainda mais após o sucesso da Olimpíada. É como ter sido convidado para uma festa e ter que se contentar com o que sobrou da comemoração anterior.

Felizmente, saímos rapidamente do vexaminoso patamar de 100 mil ingressos vendidos para a marca de 1,4 milhão. Ainda restam 900 mil. A cerimônia de abertura vendeu 40 mil, o que é maravilhoso.

Já disse isso, o Rio tem a chance de fazer a melhor Paraolimpíada da história. Mas não dá para descuidar do básico, e quartos limpos e transporte eficiente são o mínimo que os atletas precisam. Que sejam esses os maiores problemas e que sejam solucionados.

Nota: o diretor de comunicação da Rio-2016, Mario Andrada, disse que as acusações de problemas com a limpeza dos apartamentos e com o transporte "não procedem". Afirmou ainda que "o repasse de verba municipal está dentro do previsto e os novos patrocinadores completaram o financiamento dos Jogos".


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