Folha de S. Paulo


É possível ser a favor e crítico

Pode dar uma trégua para sua carteirinha de manifestante —use apenas em caso de emergência. A Olimpíada começou, os atletas estão aí. Nenhum deles resolverá problema algum. Fique tranquilo que eles, os problemas, estarão nos esperando assim que as cortinas caírem e as grandes estrelas desse espetáculo forem embora.

Motivo para reclamar não vai faltar. Mas tudo em sua hora. Em duas semanas não há o que fazer. A baía continuará suja, a desigualdade gritante, o Estado falido, a polícia ineficiente, os hospitais sucateados, os servidores públicos com salários atrasados, o país à deriva, a violência... Nem quero pensar o que será depois do dia 21 de agosto.

Sim, relaxe, não sinta-se alienado. A partir de hoje você pode ligar a TV, comprar ingresso (ainda há milhares disponíveis), pegar uma bandeirinha verde e amarela e fazer algo que não desabona suas convicções políticas, econômicas e sociais: torcer pelos mocinhos dessa história, os atletas que vão competir no Brasil.

Pode torcer por brasileiro, por sudanês, por búlgaro, até por australiano, e mostrar que nós, brasileiros, não temos nada a ver com a tosquice de nossos políticos.

Sim, amigos, vamos torcer. Torcer para que a Olimpíada seja um sucesso em relação a tudo que está lá no manual do Comitê Olímpico Internacional: excelência, amizade e respeito. Bonito, mas não só bonito. É o que veremos nas arenas, gente dando o couro, suando, sentindo dor, adrenalina, alegria, frustração, admiração.

Torcer para que o evento ocorra sem incidentes, que as arenas estejam em condições minimamente decentes, que o público se divirta e se encante com os melhores do mundo, que os turistas sejam bem recebidos, que as delegações consigam chegar aos locais de prova –a previsão é que o trânsito seja um horror.

Tem tanta coisa que pode dar errado, que nem precisa ser contra.

Torcer, sobretudo, para que os atletas consigam ter o seu melhor desempenho, quebrem recordes, não se machuquem, que aproveitem essa vitrine olímpica para fechar contratos, garantir patrocínios.

O que está em jogo agora não é a reputação de uma cidade ou de um país, a capacidade que temos ou não de organizar um evento, as mazelas do nosso cotidiano, as vaidade políticas, a crise que nos assola.

O que está em jogo são projetos de vida, sonhos, desafios, esforço, dedicação. Estamos falando de gente que investiu quatro anos, a vida, para estar no centro de uma arena e mostrar ao mundo a que veio.

Vai ter comentarista de Facebook pregando que não tem como ser a favor e crítico ao mesmo tempo. Errado. Agora é hora de torcer, gritar, aplaudir, comemorar. Dia 22 voltaremos com a programação normal.

Brasileiros classificados para a Olimpíada


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