Folha de S. Paulo


Como esquecer alguém

Ontem quando eu escrevia esta coluna, que era sobre vagina, recebi a seguinte mensagem: Mariliz, sigo você e sou seu fã, como faço pra esquecer alguém? Minha namorada resolveu voar. Me disse chorando que me amava, mas precisava disso. Já faz dois meses, baladas, outras meninas, porres, nada me preenche. Sei que ela está feliz, então deixo quieto, mas quero passar por essa fase logo. O que devo fazer?

Li a mensagem, voltei aos meus prazos, vagina pra cá, periquita pra lá, não consegui mais parar de pensar no pobre diabo, tão desesperado, que vem pedir conselho a alguém que não sabe nem amarrar o cadarço direito.

É a pergunta de um bilhão de dólares. Estaria rica, deitada numa sombra, no sul da Tailândia, no terceiro drink cor de rosa, sendo abanada por eunucos, com leques gigantes de pena de pavão, cheirando a curry. Mas estou aqui pensando em alguma mentira convincente.

Todas as vezes que a gente termina uma história, de forma amistosa ou não, sofre de um jeito diferente, porque os finais nunca são os mesmos. Mentira, eu sempre sofro muito, mesmo que a pessoa não tenha a menor importância. Não sei lidar com rejeição.

Mas claro que algumas vezes o dramalhão era real e eu levava algumas semanas passando por todas as fases de um legítimo pé no rabo. Primeiro achava que iria morrer, depois que nunca conseguiria esquecer o fulano, que jamais gostaria de outra pessoa. Daí ficava intragável feito jiló, com raiva de casais felizes, ou de qualquer pessoa que respirasse sorrindo.

Teve uma época em que eu emendava um sofrimento a outro. Até que chegou o dia que entendi que o repertório era o mesmo. E nem eu mesma me aguentava sofrendo do mesmo jeito. Coitados dos amigos. Desculpe, Eva, eu sei fui insuportável 37 vezes. Obrigada por sempre limpar meu nariz escorrendo.

Comecei a me permitir sofrer cada vez menos tempo. A gente demora para entender que enquanto chora, come sorvete e assiste "Sob o Sol da Toscana", o outro já está comendo alguém.

Tenho uma resposta? Longe disso. Só sei o que vivi.

Lembro quando sofri por três meses. Me isolei, fiquei em casa curtindo uma puta fossa e morrendo de pena de mim mesma. Não adiantou. Só serviu para perder cinco quilos, a Mostra de Cinema, a Restaurante Week e a liquidação de inverno.

Numa outra ocasião, foram quatro semanas. Precisei exorcizar a dor de um chifre. Acendi vela na igreja, tomei passe no centro espírita, consultei um tarólogo, fiz massagem de pedras quentes, sexo com desconhecido, soquei travesseiros, esvaziei muitas garrafas de vinho, procurei um cartomante para uma segunda opinião. Queria saber se eu voltaria a ser feliz. Paguei para saber o que eu já sabia.

Na última vez, eu tinha duas semanas de férias. Comprei uma passagem, fui pra Itália e brinquei de comer, beber e amar nesse curto espaço de tempo. Queria ter comprado uma casa na Toscana, mas não tinha dinheiro. Não deu para esquecer o maledeto, mas ao menos eu já conseguia comer sem querer vomitar.

É muito difícil gostar de alguém e ele preferir jogar sinuca num bar que vende cerveja quente a estar com você. Arrisco dizer que a frustração é igual quando temos 18 ou 60 anos. Gente que ama não tem maturidade. A diferença é que quando ficamos mais velho temos vergonha de assumir que amargamos três dias em casa, de moletom, sem lavar o cabelo, chorando e ouvindo Whitney Houston.

A coluna está terminando e ainda não consegui pensar em nenhuma frase impactante para meu leitor. Cara, gostaria de poder ajudar, mas só você pode. Só consigo dizer o seguinte: Não coma todo chocolate do mundo. Não engravide alguém. Não vomite no travesseiro. Não ligue para ela quando estiver bêbado. Ou sóbrio. Faça um curso de origami. Perca as esperanças. Ela já está em outra.

Pode ser um bom começo.


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