Folha de S. Paulo


Volta pro mar, oferenda

Foi o Facebook e não o pai de santo quem me trouxe de volta muita gente que eu fico feliz de verdade em conviver ao menos virtualmente. As redes sociais são quase sempre uma fonte de alegria. Todo mundo deve lembrar dos primórdios, como eram boas as surpresas de reencontrar amigos com quem não tínhamos contato durante anos. O pessoal do colégio, da faculdade, do bairro.

Bacana rever a Simone, minha arquirrival no basquete. Ela me dava olé nos jogos e a gente dividia porradinha, uma mistura de vodca vagabunda com refrigerante xexelento, para comemorar as vitórias dela. Ela brilhava nas quadras e eu era a rainha da balada. Nos encontramos 20 anos depois e passamos horas tomando cerveja, como duas adultas. Obrigada, Facebook.

A vida levou pra longe gente querida, mas o Instagram nos mantém próximos. Tem a Tais, que mora em Cingapura. A Paula, que está em Nova York. A Bia que acabou de casar em Paris, e eu pude acompanhar pelas fotos postadas pelo aplicativo.

Funciona até entre gente que mora na esquina, mas a gente nunca tem tempo pra ver. A Alessandra, por exemplo, vive aqui ao lado, ficamos uma semana sem nos falar, mas ela sabe até a mistura do meu suco verde de quinta-feira passada.

É uma puta mão na roda também quando seus pais estão em outra cidade. Eu já tenho idade para ser mãe, mas a minha quer sempre saber onde, como e com quem estou. Ela fuxica minha redes sociais, descobre que meu carro está na oficina, que a Ivonilde não veio, que fui cobaia do curso de comida japonesa do marido. Já não me liga mais todo-santo-dia.

E aquele namoradinho da adolescência. Ai que satisfação ver que ele ficou gordo, careca, e ainda acha que vai te comer com aquele papo de mil, novecentos e guaraná com rolha. Espelho, meu amor. Também já fiquei passada de ver a foto de um ex, que ficou mais lindo, mais sarado, mais gato, mas continua girando o rodo na galera. Bom te ver, amor. Bem longe de mim.

Mas como nem tudo são flores, redes sociais são um atalho para encontrar pessoas que deveriam ter ficado lá na terceira dimensão de 1995. Gente com quem eu não tinha afinidades numa época que birita ou maconha –ou birita e maconha– transformam todo mundo em melhores amigos.

Na época da faculdade, fulaninha vivia me chamando de patricinha e me zoando porque eu lia Nova, Marie Claire, essas coisas. Fulaninha não fala comigo há 20 anos, me adiciona, não me manda uma mensagem, tipo "e aí, belê?". Cada post dela começa com "a direita mostrando seu caráter explorador". Pra que fulaninha quer ser minha amiga, mesmo que virtual? Ela continua igualzinha e eu estou pior. Agora leio Vogue, Vanity Fair, e gosto de fazer isso tomando Spritz. Socorro, me deixe com as minhas futilidades burguesas. Vá militar em outra timeline.

Mas o que mais me chocou recentemente foi um professor, que eu achava legal. Aquela história: birita+maconha=melhores amigos. Ainda mais na faculdade de jornalismo. O cara te adiciona e desde o primeiro dia brada aos quatro ventos desatinos contra a mídia golpista. Trabalhei em todos os veículos, considerados por ele, integrantes da mídia golpista. E ele me manda mensagem inbox me desejando sucesso e me parabenizando pelo meu trabalho. Depois vem defender terrorista na minha timeline. É muita birita e maconha durante muito tempo pra danificar os neurônios da pessoa –dele. Que os efeitos da maconha e da birita tenham se prolongado por quatro anos –em mim– e eu não tenha aprendido nada com ele. Amém.

Mas o melhor foi um colega de trabalho. Garoto-enxaqueca, que discordava de tudo que eu postava. No começo achei que ele sentia tesão por mim. Depois comecei a contestar a minha inteligência. No final, concluí, que ele era um maleta mesmo. Chato e desagradável.

Por que esse pessoal volta como uma assombração em nossas vidas? Eles não puxam o pé, mas enchem o saco. Deletei e bloqueei todos. Deletar é vida, bloquear é saúde. Volta pro mar, oferenda. Espero que se afoguem em suas chatices e sua arrogância.


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