Folha de S. Paulo


Vamos falar de traição

Puta. Vagabunda. Vadia. Oportunista. Esses foram alguns dos carinhosos elogios feitos à loira da discórdia, a garota flagrada aos beijos com o humorista Marcelo Adnet. O assunto mais comentado dos últimos dias trouxe à tona não apenas a pulada de cerca e uma possível reconciliação entre o casal famoso, mas o que nós, que também amamos, traímos, somos traídos, julgamos e somos julgados, pensamos sobre o assunto.

Na hora de dar pitaco na vida alheia mostramos que somos quase trogloditas quando posamos de bem resolvidos. Mas o mais assustador foi ver a ala feminina crucificar uma mulher com os argumentos mais toscos e medievais possíveis. Trair ainda é visto como um comportamento que faz parte da essência masculina, como se os homens nunca tivessem evoluído e hoje essa atitude não pudesse ser apenas mais uma das escolhas que a gente faz na vida.

Homens comprometidos usarem essa desculpa esfarrapada para não controlarem seus pintos dentro de suas calças já é de uma ignorância atroz, mas as mulheres repetirem essa ladainha é burrice, tiro no pé. Apontar o dedo contra uma garota solteira, que tem o direito de se divertir com quem ela quiser é de uma estupidez sem fim.

Sim, talvez ela não seja uma pessoa confiável, talvez os pais tenham ficado com vergonha, talvez as amigas tenham dito que ela fez uma cagada, talvez ela tenha desvios de caráter, mas não fez nada que justifique ser chamada de piriguete ou biscate. Ela, no momento que se engalfinhou com um cara casado no meio da rua, tinha apenas compromisso com ela mesma. E não há nada de errado com isso. Então, vamos combinar que se alguém fez merda nessa história não foi ela.

Mulheres, que classe mais desunida. Traição de homem quase sempre tem uma desculpa. A mulher embarangou. O casamento está falido. A colega de trabalho deu mole. Sexo e amor são coisas diferentes. Mas quando é a mulher quem resolve fazer frila por aí só tem uma explicação: vadia. Ninguém alivia. A culpa é sempre da mulher. Em qualquer caso.

Outra discussão interessante foi 'perdoar ou não perdoar?'. Não há o que ponderar, cada um sabe se conseguirá dar um refresh na história e ir adiante sem enlouquecer e transformar a vida do outro num inferno. Achei bonita a atitude da traída de dizer que as pessoas erram e acenar com um 'vida que segue'. Eu não conseguiria.

Já fui traída duas vezes –que eu saiba. E nas duas não consegui ser elegante, chique ou equilibrada. Foi ponto final mesmo. Nunca mais confiaria naquelas pessoas. Senti raiva, vergonha, revolta. É um golpe tão baixo que a gente chega a pensar o que fez de errado para merecer um chifre.

Na última vez, comprei uma passagem para a Itália e fiquei lá por duas semanas para amenizar a dor. Não sem antes dar um chilique, gritar, xingar até o manobrista do prédio do infeliz, colocar todos os presentes que ele havia me dado dentro de uma caixa e despachar pelo correio. Em nenhuma das vezes me passou pela cabeça destratar as moças cúmplices das rasteiras que levei. As duas sabiam que os caras não eram livres, mas elas não tinham nenhuma relação comigo. O compromisso era entre mim e eles.

Sou do tipo "ame e dê vexame", ainda mais quando se trata de corno, mas vou no alvo certo. Não que eu me orgulhe disso, sofro demais com a trairagem, não há terapia no mundo que me faça encarar uma filhadaputagem dessa e bancar a evoluída. Não sou e prefiro resolver tudo de uma vez. Admiro quem consegue passar por cima, ou mesmo ter um arranjo no relacionamento que permita uns extras de vez em quando. E deve ter muita gente por aí varrendo a sujeira pra debaixo do tapete.

Cerca de 70% dos homens brasileiros são ou já foram infiéis. Imagine se toda essa bandalheira viesse à tona e as mulheres resolvessem mandar os ditos pastarem. Por isso dá pra entender que haja tanta gente que prefere o 'não sei, não quero saber' ou acreditar que as pessoas erram. Se tanta coisa aqui acaba em pizza, por que não aconteceria o mesmo com casos de traição? Prefere marguerita ou calabresa? Eu prefiro nenhuma.


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