Folha de S. Paulo


Não, não está faltando homem

Eu nunca engrossei o coro da mulherada que adora dizer: não tem homem no mercado; os caras não querem nada; são todos iguais. É a melhor desculpa que qualquer uma pode dar para justificar o fato de estar sozinha. Com exceção daquelas que preferem não ter ninguém –e o mundo está cada vez mais cheio delas.

É assim desde que a gente tinha uma vida analógica, onde a forma natural de conhecer alguém era cara a cara, e as únicas maneiras de ser encontrada eram pelo telefone de casa ou por carta.

Troquei dezenas, senão centenas de correspondências com os garotos que conheci nas férias de verão, nos campeonatos de basquete ou de natação. A gente escrevia cartas, mandava fotos, fazia juras de amor, tudo com o carimbo do correio. Encontrava uma vez ou outra, não passava disso, mas deixava a autoestima tinindo e a nossa carência muito bem entretida.

Também já briguei muito com meu irmão por monopolizar o telefone de casa. Desliga essa merda, ele gritava na extensão. Eu morria de vergonha. Amarguei muito castigo e fiquei sem mesada por causa da conta.

Todo mundo dava um jeito, mas não faltava homem.

Então, eu fico surpresa quando ouço qualquer mulher vir com um chororô de que está difícil, que eu tive sorte. Talvez eu tenha tido mesmo. Mas para achar a pessoa certa, já me estropiei com um bocado de caras errados. Também me diverti horrores com uma lista interminável daqueles que só servem pra isso: diversão. E sei de uns dois que devem ter feito bonequinho de vodu com o meu nome porque eu não fui lá muito legal com eles.

Nunca faltou. Nunca tive medo que faltasse. Nem com 20, nem com 30, nem com 40. Mas nunca fiquei sentada, esperando.

A gente se conhece mais a cada pé na bunda que leva, a cada pilantragem que faz com alguém. São apenas essas experiências que nos mostram o que queremos e que tipo de pessoa será aquela com quem completaremos todas as bodas possíveis até que a morte ou a falta de amor nos separe.

Não acredito que exista uma única pessoa certa para nós. O mundo está cheio de gente interessante. Sorte é estar na hora certa, no lugar certo quando o lugar e a hora são os mesmos de alguém que nos faz suspirar. Na primeira ou na segunda tentativa. Não foi o meu caso. Não é o da maioria. Pra gente só resta tentar, se ferrar, tentar, se foder, tentar, tentar, tentar, até que os relógios da vida deixem de boicotar as relações e aquela tentativa se torne nós dois.

Eu não vejo as mulheres fazendo muito esforço. Tem que ter vontade, disposição e paciência. Não tem jeito, é preciso sair do castelo e subir no cavalo sozinha. Abraçar a vida. Aprender a ser feliz sem ninguém. Meter a cara. Enfiar os pés pelas mãos. O que não dá é ficar lamentando.

O mundo nunca teve tanto homem disponível. Mas não depende apenas deles. Cada um pode e deve fazer a sua parte.

Tem solteiro, separado, viúvo –sem contar os canalhas comprometidos que não saem da pista. Eles estão no bar, na balada, na praia, na mesa ao lado no trabalho, no casamento dos amigos, no curso de churrasco da minha amiga Letícia, atravessando a rua, na poltrona ao lado no avião, correndo no parque, fazendo compras no supermercado. Mas principalmente na internet. E se eu fosse solteira, estaria lá também.

E já estive.

Entrei num site de relacionamento quando o que eu tinha foi pro brejo. Fiquei na merda, me sentindo a mosca do cocô do cavalo do bandido. Se inscreva nesse site, me disse uma colega de trabalho. Vai fazer um bem enorme à sua autoestima. Recebi 264 mensagens em poucas horas. Flertei online com vários tipos. E depois de uma troca infinita de emails e papos intermináveis no falecido Messenger recebi um convite pra sair no dia dos namorados pra assistir ao show do Billy Paul.

Ele não se deu conta de que é dia dos namorados, vai desmarcar, pensei. Até Papai Noel sabe o que acontece no dia 12 de junho. Me esperou fora do carro, dançou de rosto colado, me levou pra jantar. Engatamos dois meses de namoro. Triatleta, apartamento lindo, executivo de uma multi, e ficou apaixonado por mim. Mas ele não bebe, desanimei durante um jantar, enquanto terminava a segunda taça de vinho, querendo pedir a terceira. Ele no ice tea. Não vai dar conta quando me vir mexendo no gelo do copo, às 4h da manhã, dançando "Walking on a Dream".

Terminei.

Mas ele era tão bom, que eu quis passar para uma amiga. Nenhuma acreditou. Uma pena. Era o tipo de cara que dificilmente alguma de nós encontraria no bar ou na balada, mas estava na internet procurando alguém legal como qualquer uma de nós.

Talvez em cinco anos tudo seja mais natural. Até lá, as reações são curiosas. Muita gente dizendo não para o que nem conhece. Não é para mim. Não tenho paciência. Os caras só querem sexo. Bem, quem não quer? Mas quem quer apenas isso?

Pode ser no Tinder, no Par Perfeito, no Bang with Friends, tanto faz. Quando a gente se abre para o mundo, um mundo de possibilidades se abre para nós. A gente precisa parar de olhar para os homens como se eles fossem nossos inimigos. Tenho amigos. Eles querem namorar, casar e dormir de conchinha. E já estão ficando chatos como as mulheres dizendo que a gente é tudo igual e não vale nada.

Quanto desencontro.

Pode ser no Facebook, no Twitter, no Tumblr. Nunca foi tão fácil e tão divertido – tenho certeza– conhecer gente nova. Não, não está faltando homem. Nem mulher. O que falta é que as pessoas saibam o que querem, deixem de ser chatas e parem de esperar que o príncipe ou a princesa caiam do céu. Pode dar errado de novo. Faz parte. Mas pode dar certo.

P.S. Faltam duas semanas para o dia dos namorados. Com um pouco de empenho e um tantão de sorte dá pra chegar no dia 12 com o status do relacionamento diferente. Ou no mínimo com alguma história nova pra contar. Isso se chama viver.


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