Folha de S. Paulo


A despedida do gigante Emanuel

Sabe quando sua tia solta aquela pérola: "Não se fazem mais... (complete aqui com o que quiser) como antigamente", suspirando com o olhar perdido em um tempo que não volta mais? Pois foi esta frase que me veio à cabeça quando soube que Emanuel havia decidido anunciar a aposentadoria.

Não que os jogadores de vôlei de praia sejam ruins atualmente. Pelo contrário. São excepcionais e têm evoluído a cada ano, dentro e fora do Brasil. Continuamos a ser referência e a frequentar o pódio das principais competições.

Mas não surgiu nada que se compare a Emanuel. E será difícil surgir.

Magricelo (80 kg para 1,90 m de altura), ele parece um estranho no meio daqueles gigantes da areia que não param de crescer e encorpar.

Mas compensa a aparente fragilidade com muita técnica e muito cérebro. É o que nos acostumamos a chamar de jogador completo, com fundamentos muito apurados.

É tão acima da média que conseguiu jogar em alto nível até os 42 anos. Só parou porque não terá a chance de disputar mais uma Olimpíada –a CBV (Confederação Brasileira de Vôlei) escolheu outras duas duplas masculinas para representarem o Brasil em agosto.

Desde que o vôlei de praia entrou nos Jogos, Emanuel esteve na disputa. Foi a cinco edições: Atlanta-1996, Sydney-2000, Atenas-2004, Pequim-2008 e Londres-2012. Ganhou três medalhas, uma de cada cor. Duas delas ao lado de Ricardo. Um gigante que contrastava com o magrelo. Opostos complementares.

Além da qualidade técnica, Emanuel é reconhecido pelos números que quantificam suas conquistas. E são muitos. Foi eleito o atleta da década de 1990 pela federação internacional. Aos pódios olímpicos, soma três títulos mundiais (com três parceiros diferentes), dez do Circuito Mundial e nove do Brasileiro.

Foi o jogador (homem ou mulher) que mais disputou (254) e ganhou (76) eventos do tour internacional.

Conquistou também o coração de Leila, outro ícone do vôlei brasileiro.

Tentei puxar de um amigo, profundo conhecedor do vôlei, alguma história marcante do jogador fora das quadras. A resposta? "Ele é ruim de história". É mesmo. E para muitos, é uma de suas grandes qualidades.

Emanuel fala pouco. É discreto. Sempre deixou seus resultados, suas atuações e ações falarem por ele.

Em 2004, emocionado, ofereceu sua medalha de ouro a Vanderlei Cordeiro de Lima, que saiu de Atenas com o bronze na maratona após ter sido agarrado por um padre irlandês durante a prova. O corredor agradeceu a homenagem, mas não ficou com o prêmio.

Emanuel também não se furta a discutir o esporte. É membro das comissões de atletas do COB e do Ministério do Esporte e já integrou a da Agência Mundial Antidoping.

Além dos títulos e do talento, sempre foi profundamente respeitado por adversários e amigos. Uma tríade de qualidades que fazem dele um dos mais importantes jogadores de vôlei de praia de todos os tempos.

Na semana que vem, ele pisará pela última vez na areia. Escolheu o Rio para se despedir. Bonito, mas amargo. Queria mesmo era entrar na arena de Copacabana em agosto, para dizer adeus no palco olímpico, que sempre o acolheu.

O jogador Emanuel ficará no passado. Vai virar coisa de antigamente. Mas seu exemplo estará sempre presente.


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