Folha de S. Paulo


Prata da Casa

"Amarelou de novo?"

A pergunta passou pela cabeça de muita gente ao saber que Fabiana Murer havia perdido a medalha de ouro no Mundial de atletismo. Afinal, ela errou o último salto. E não é isso que ela faz sempre?

Em Pequim-2008, deu como desculpa o sumiço de uma de suas varas; em Londres, culpou o vento. No último Pan, deu mole para a cubana, a mesma que a derrotou agora.

Mas quem acordou cedo para assistir à final do salto com vara viu outra cor na medalha pendurada no pescoço dela. Viu uma prova de alto nível e emocionante, com duas atletas travando um duelo acirrado.

Fabiana saltou 4,85 m, igualando seu salto mais alto. Mas não foi suficiente para os 4,90 m de Yarisley Silva, que já saltou 1 cm a mais.

A cubana foi melhor, simples assim. Não teve amarelo. Teve prata.

Fabiana é a melhor atleta do país em Mundiais, que existem desde 1983. Joaquim Cruz, ouro olímpico em 1984, por exemplo, tem só um bronze nesse evento. As estrelas do revezamento 4 x 100 m vice-campeãs em Sydney-2000 também nunca chegaram ao topo do pódio. Fabiana tem um ouro e uma prata.

Ela falhou em duas Olimpíadas, é verdade. Em 2008, foi vítima de um azar danado ao ver uma vara sumir. Não havia como saltar bem. Em Londres, não soube administrar as dificuldades da prova. Reclamou do vento, sim, mas também assumiu seus erros: "Foi culpa minha. Estava tentando melhorar o meu salto, mas ele não está consistente". Não foi poupada, no entanto, do linchamento raso nas redes sociais.

Fabiana coleciona bons resultados: tem quatro medalhas em Mundiais indoor e outdoor, duas em Pans e figura há quatro temporadas no pódio da Liga Diamante, circuito anual de provas internacionais do atletismo. Mais: se mantém entre as top do mundo desde 2006. É muito tempo. Algumas de suas primeiras rivais já pararam, uma nova geração chegou, e ela continua ali.

Aos 34 anos, está atingindo o auge de suas marcas. Tachá-la de amarelona é uma grande injustiça.

A confiança que Fabiana mostrou em Pequim dá sinais de que ela está em grande forma. Mas ainda há um longo caminho a ser percorrido para transformar isso em ouro em 2016.

O salto com vara é talvez a mais equilibrada prova do atletismo hoje. Entre suas rivais estão Jennifer Suhr (EUA), ouro em Londres-2012, Yarisley Silva, campeã mundial, e a russa Ielena Isinbaieva, o maior nome de todos os tempos, que pode voltar às competições após ter filho.

Fabiana tem condições de ganhar o ouro, mas pode também terminar em quarto ou quinto lugares. Como qualquer uma das outras. Amarelar? Não, apenas o ônus de estar entre as melhores do mundo.

Fabiana já foi bastante questionada por seus tropeços e sempre respondeu com resultados. O Brasil só ganhou uma medalha nesse Mundial. A prata de Fabiana.


Endereço da página:

Links no texto: