Folha de S. Paulo


O Brasil não se preparou para o envelhecimento da população

Lalo de Almeida/Folhapress
Aposentados que querem ter aumento no benefício podem pedir uma revisão no ano que vem
Fila em posto do INSS

Projeto que autoriza o reajuste de planos de saúde de beneficiários com mais de 60 anos, o que não é permitido pelo Estatuto do Idoso; reforma da Previdência, com pelo menos ampliação da idade mínima para aposentadoria. Essas propostas não têm em comum somente o interesse do atual governo federal.

Elas indicam claramente que o Brasil não se preparou para o aumento da longevidade e do percentual de idosos na população. Pode-se dizer que o Estatuto do Idoso foi uma tentativa de proteger os cidadãos com 60 anos ou mais, mas as transformações teriam de ser estruturais, profundas, muito bem planejadas, a fim de assegurar recursos financeiros para a assistência aos idosos.

Por décadas, fomos o país do futuro, das crianças e dos jovens. Como no hino nacional, permanecemos deitados (quase) eternamente em berço esplêndido. A Previdência Social, por sinal, foi criada com base no trabalho registrado em carteira. O empregado de hoje, ao contribuir para a Previdência, teoricamente deveria bancar o pagamento dos já aposentados. No futuro, quem estivesse na ativa faria isto por ele, e assim sucessivamente.

A proporção de trabalhadores na ativa para aposentados, no entanto, vem caindo acentuadamente, em parte pela mudança da pirâmide etária, mas também pelas novas formas de trabalho, sem registro em carteira e por períodos mais curtos.

Mesmo quando a natalidade começou a cair e a longevidade a aumentar, não ocorreu uma mudança drástica no modelo previdenciário, embora já houvesse advertências sobre um futuro fim do 'bônus demográfico', ou seja, quando houvesse mais pessoas aposentadas do que trabalhando.

Praticamente nada foi feito, e hoje Executivo e Legislativo não se entendem sobre o que fazer para evitar a falência da Previdência.

Na saúde não é diferente. Tanto no SUS (Sistema Único de Saúde), público, quanto nas operadoras privadas, pouco ou quase nada foi providenciado para solucionar uma difícil equação: idosos gastam várias vezes mais do que jovens com consultas, exames e cirurgias, justamente quando têm renda bem menor.

Todas as medidas propostas para reduzir o deficit previdenciário e a situação da medicina pública e privada vão custar caro para os brasileiros de todas as idades. Implicam perda de direitos e mais despesas.

Ninguém se engane, contudo. Se não forem adotadas hoje, entrarão em vigor no futuro, com maior impacto, porque os prejuízos terão se aprofundado. Pagamos caro, portanto, pela falta de planejamento, de ação, de vontade política e de administração.

Só me referi à incapacidade gerencial, mas também há, obviamente, os malfeitos que povoam as manchetes do noticiário. Deixamos o dinheiro escoar pelo ralo e fingimos que nunca teríamos de pagar pelos desatinos dos políticos que elegemos.

O que fazer agora? Programas de medicina preventiva, ações para pacientes crônicos e reformulação urgente da Previdência, sem privilégios para determinadas corporações. Será necessário, também, obter recursos de alguma área nova, talvez legalizando o jogo, por exemplo, que continua firme na ilegalidade, isento de impostos e de contribuição previdenciária.

Se continuar essa inércia, os idosos se tornarão consumidores e cidadãos de segunda classe ou à margem do mercado de consumo, depois de terem trabalhado e contribuído com o país ao longo da vida.


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